As duas jóias

Narra antiga lenda árabe, que um rabino, religioso dedicado, vivia muito feliz com sua família, esposa admirável e dois filhos queridos.

            Certa vez, por imperativos da religião, o rabino empreendeu longa viagem ausentando-se do lar por vários dias. No período em que estava ausente, um grave acidente provocou a morte dos dois filhos amados. A mãe sentiu o coração dilacerado de dor.

            No entanto, por ser uma mulher forte, sustentada pela fé e pela confiança em Deus, suportou o choque com bravura. Mas uma preocupação lhe vinha a mente: como dar ao esposo a triste notícia? Sabendo-o portador de insuficiência cardíaca, temia que não suportasse tamanha comoção.

            Lembrou-se de fazer uma prece.

            Rogou a Deus auxílio para resolver a difícil questão. Alguns dias depois, num final  de tarde, o rabino retornou ao lar. Abraçou longamente a esposa e perguntou pelos filhos. Ela pediu para que não se preocupasse. Que tomasse o seu banho, e logo depois ela lhe falaria dos moços.

            Alguns minutos depois estavam ambos sentados à mesa. Ela lhe perguntou sobre a viagem, e logo ele perguntou novamente pelos filhos. A esposa, numa atitude um tanto embaraçada, respondeu ao marido:

 – Deixe os filhos. Primeiro quero que me ajude a resolver um problema que considero grave.

            O marido, já um pouco preocupado perguntou:

– O que aconteceu? Notei você abatida! Fale! Resolveremos juntos com a ajuda de Deus.

– Enquanto você esteve ausente, um amigo nosso visitou-me e deixou duas jóias de valor incalculável, para que as guardasse. São jóias muito preciosas! Jamais vi algo tão belo! O problema é esse! Ele vem buscá-las e eu não estou disposta a devolvê-las, pois já me afeiçoei a elas. O que você me diz?

– Ora mulher! Não estou entendo o seu comportamento! Você nunca cultivou vaidades! Por que isso agora?

– É que nunca havia visto jóias assim! São maravilhosas!

– Podem até ser, mas não lhe pertencem! Terá que devolvê-las.

– Mas eu não consigo aceitar a idéia de perdê-las!

            E o rabino respondeu com firmeza: ninguém perde o que não possui. Retê-las equivaleria a roubo!

– Vamos devolvê-las, eu a ajudarei. Faremos isso juntos, hoje mesmo.

– Pois bem, meu querido, seja feita a sua vontade. O tesouro será devolvido. Na verdade isso já foi feito. As jóias preciosas eram nossos filhos.

– Deus os confiou a nossa guarda, e durante a sua viagem veio buscá-los. Eles se foram…

            O rabino compreendeu a mensagem. Abraçou a esposa, e juntos derramaram muitas lágrimas.

Publicado na Revista nº 3 – 2003 – Escola de Pais – Seccional de Timbó

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