Para falar sobre a educação sexual na adolescência e vincular o tema ao movimento Escola de Pais, o texto irá abordar os seguintes pontos: como a Escola de Pais aborda a temática, quais são os espaços mais significativos em que ocorre a Educação Sexual e quem são os educadores sexuais, como se dá a construção de nossa sexualidade, adolescência e comportamento jovem nos dias de hoje.
A Escola de Pais aborda de forma bastante simples a educação sexual, focando principalmente nos valores familiares, na construção de um indivíduo consciente de suas decisões e de suas escolhas e também na alteridade e no respeito ao outro através dos círculos de debates que promovem em escolas, empresas, bairros, ou seja, em locais onde existir um grupo de pais interessado em melhorar a educação de seus filhos. Esse trabalho é importante para aqueles que têm a possibilidade de vivenciar essa experiência, seja nos círculos de debates presenciais ou virtuais.
Porém, existem outros espaços onde está sempre ocorrendo a educação sexual além da família: escola, centros de saúde, amigos, vizinhos, via televisão, mídias eletrônicas, mídias impressas, dentre outros. Melo e outros (2010) pontuam que somos todos educadores sexuais uns dos outros queiramos ou não, saibamos ou não. Ou seja, sempre estamos educando sexualmente uns aos outros em nossas relações sociais. O ser humano, sempre sexuado desde o início de sua vida, é educado nas relações sociais que estabelece com os adultos com quem convive, com seus pares e pelos valores repassados pelos meios de comunicação, mas também educa à medida que aprende e se desenvolve. A nossa sexualidade é construída e reconstruída, em suas significações, nessas relações e no contexto histórico-social em que elas ocorrem.
Segundo Nunes (1987), ao longo da história da espécie humana, a sexualidade se manifestou e se transformou dentro de processos permanentes de educação sexual. As mudanças biológicas, psíquicas, sociais e culturais vivenciadas pelo ser humano nesses processos promoveram transformações nas manifestações da sexualidade e na forma de abordagem vivenciada de educação sexual, reflexos dessa construção sócio-histórica e cultural.
Nunes descreveu em seu livro: Desvendando a Sexualidade, momentos históricos e as manifestações da sexualidade nesses momentos. Alvin Tofler em seu livro, A terceira onda, cita três ondas vivenciadas na história da humanidade: revolução agrícola, revolução industrial e revolução tecnológica. Segundo ele, cada onda transformou o arcabouço do conhecimento e da realidade. Na sociedade agrária, a principal forma de capital era a terra, importava apenas um mínimo de noção sobre o plantio e o ânimo corporal para trabalhar. As informações eram encontradas em poucos espaços: família, igreja, escola. Na segunda onda, surgiram outras formas de gerar riqueza: oficina industrial e corretagem de bens e essas passaram a gerar recursos econômicos e financeiros, tornando-se a fundamental produtora de empregos. A informação, além dos espaços já conhecidos passou a ser encontrada em jornais, revistas, rádio e da televisão. A distribuição de conceitos visuais foi vastamente disseminada. Na terceira onda, o principal recurso econômico é o conhecimento. Nesta nova sociedade, a informática precipita a absorção de informação, transformando intensamente a estrutura do conhecimento e da realidade em que vivemos. Nessa terceira onda, alguns trabalhos do homem serão substituídos pelas inovações tecnológicas. Além disso, Vivemos a internacionalização do comércio proporcionado pela globalização, a universalização da produção e do consumo, administrado pela direção econômica neoliberal.
Essas grandes mudanças na sociedade, fruto das relações humanas, influenciaram nas manifestações de nossa sexualidade e nas suas significações e continuam a influenciar, a sexualidade é parte de nossa personalidade. Nesse sentido, essas manifestações perpassam também a vida daqueles que convencionamos chamar de adolescentes e portanto, para compreender como lidar com eles, na questão de sua dimensão de sexualidade é preciso contextualizar o que é adolescência e mais, quem é o adolescente do século XXI.
A adolescência, construto cultural das sociedades contemporâneas, é um período de transição entre a infância e a idade adulta. Sendo assim ela é marcada por descobertas, experimentações e vivência da liberdade, bem como pela construção de capacidade para a tomada de decisões, de escolha, de responsabilidades e de afirmação de identidades, tanto pessoais como políticas.
Segundo Buckingham (2007), o adolescente, sendo bem orientado, tem condições de tomar decisões, ou seja, agir de forma autônoma e responsável. Ainda segundo esse autor, muitos teóricos focam na adolescência como período de conflitos, de dificuldades, de problemas, não encarando este período como mais uma etapa do desenvolvimento humano, essencial ao desenvolvimento da personalidade adulta, da autonomia.
Segundo a Organização das Nações Unidas Para a Educação, a Ciência e a Cultura (2003), a sexualidade se destaca como campo em que a busca por autonomia de projetos e práticas é exercida de forma singular e com urgência própria da juventude. Como afirma a Opas, as políticas e os programas de saúde voltados para adolescentes e jovens frequentemente desconsideram estes diversos aspectos da sexualidade, na medida em que “ignoram que a sexualidade é parte do desenvolvimento humano e os conceitos de amor, sentimentos, emoções, intimidade e desejo com frequência não se incluem nas intervenções de saúde sexual e saúde reprodutiva” (AINE-SCHUTT; MADDALENO, 2003). Nesta concepção, adolescentes e jovens muitas vezes ainda não são reconhecidos socialmente como pessoas sexuadas, livres e autônomas, o que tem submetido-os à situações de vulnerabilidade, no plano pessoal, social e institucional, e à diversas interdições pessoais.
A adolescência é uma etapa do desenvolvimento repleta de conflitos, pois é uma transição, ou seja, o adolescente não é mais criança, mas também não é adulto. Mas quem é o adolescente de hoje? Como ele se comporta? Segundo Rivoltella (2007), esses sujeitos respondem às mensagens do celular, ouvem música no iPod, assistem televisão e falam com os amigos no Messenger, tudo ao mesmo tempo. Da mesma forma, ele sabe que acessar a internet pelo celular é diferente, pois este é de uso pessoal e o computador, geralmente, é de toda a família. Além disso, o adolescente de hoje reconhece as especificidades de cada tecnologia e se adapta a elas. Fazer tudo isso simultaneamente é uma característica típica das novas gerações. Por um lado, isso lhes confere uma elaboração cognitiva muito rápida. Por outro, acaba deixando-os muitas vezes na superficialidade de aprendizagem e assimilação de conteúdos, bem como dos vínculos afetivos.
Essa realidade expressa por Rivoltella também influencia as manifestações da sexualidade, se a sabemos como dimensão humana e se considerarmos que essas manifestações se transformam à medida que o ser humano se transforma. Reafirmamos que os processos de educação sexual e as consequentes manifestações da sexualidade são construídos nas relações estabelecidas entre os seres humanos, sempre sexuados, na produção de suas vidas. Portanto a construção da sexualidade é um fenômeno sócio-histórico e cultural também para os chamados adolescentes.
Para concluir nossa conversa, vamos pontuar alguns caminhos, lembrando que não existem receitas prontas, mas a construção, pois cada indivíduo terá diferentes questões e reações frente a suas vivências. O primeiro e mais importante é o diálogo. Nesse diálogo, é importante procurar responder as perguntas feitas pelo seu filho, sua filha de forma honesta e clara e caso não se sentir a vontade para tal, procurar ajuda de profissional, pois se o adolescente não encontrar a resposta que deseja, poderá buscar nos outros espaços supracitados ou ficar na dúvida e, sendo assim, poderá ter problemas na tomada de decisão ou vivenciar dificuldades que poderiam ser evitadas. É importante também buscar sempre o acompanhamento de um profissional da saúde, primeiro por uma questão simples de cuidado e segundo porque como já foi dito, pais ou mães podem não se sentir à vontade para discutir sobre algumas questões e os filhos às vezes podem ter dificuldade de perguntar ou falar sobre determinados assuntos. Na escola, educadores deveriam criar espaços para abordar essas questões no cotidiano da escola, com alunos e familiares, sempre procurando responder as dúvidas trazidas e mais, trabalhando para além das questões biológicas, mas focando também na mudança de paradigmas, na construção de um pensamento reflexivo-crítico sobre o que é a sexualidade e a vivência desta. Por exemplo, com o uso do celular e da internet, os adolescentes têm praticado Sexting, que é o envio de áudio, vídeo e texto de vivências íntimas via celular, ipod, ipad, facebook e competem entre si para ver qual postagem é mais curtida. Ao trazer essa discussão para os lares e escolas, estamos trabalhando a sexualidade, o cuidado, o respeito ao outro e é nesse sentido que devemos atuar: percebendo a realidade vivida pelo nosso filho (a), aluno (a) discutir com ele, ela e orientar para que ela, ele possa ter autonomia para decidir. Como disse Buckingham (2007), o adolescente, ao ser orientado de forma coerente é capaz de agir de forma autônoma e responsável.
Referências
Buckingham, David. Crescer na Era das Mídias Eletrônicas. São Paulo: SP, Loyola 2000.
Nunes, Cesar Aparecido Desvendando a Sexualidade. Campinas – SP, Papirus, 1987.
Nunes, Cesar Aparecido. Filosofia, Sexualidade e Educação: as relações entre os pressupostos ético-sociais e histórico-culturais presentes nas abordagens institucionais sobre a educação sexual escolar, 1996.
Rivoltella Pier Cesare. Falta Cultura Digital na Sala de Aula. Revista NOVA ESCOLA Edição 200, Março 2007. Disponível em http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/pier-cesare-rivoltella-falta-cultura-digital-sala-aula-609981.shtml, acesso em: 22/03/2013, as 9h30min.
Publicado na Revista Escola de Pais do Brasil – Seccionais de Biguaçu e São José, nº 5, junho de 2014, p. 36.
Camila Detoni Sá de Figueiredo – Psicologa CRP 12/05423, Especialista em Psicologia Clínica – Psicodrama, Mestranda em Educação – UDESC.
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