Educando Filhos fortes para a vida

Começar esse processo de olharmos para como estamos caminhando ao lado dos nossos filhos é um desafio e tanto. Eu não sei você, mas eu imaginava, idealizava que tudo seria muito mais fácil do que foi. Olhando para dentro, fica claro que durante muitos anos meu coração e minha postura estavam colocados em lugares equivocados no que se refere a educação das minhas filhas. E é deste lugar que vamos falar!

Compreender nosso entendimento, perspectiva e posicionamento perante a vida em família acontecendo, nos possibilita abrirmos possibilidades de novos entendimentos sobre nós mesmos e sobre as nossas relações. 

Te convido a abrir o coração, vamos?!

Existem pesquisas que apontam a paternidade e maternidade como o momento de maior idealização na vida humana. É o momento em que recebemos o convite de uma grande virada na vida e o convite extraordinário ao amor, ao amor flecha que vai. A verdade é que quanto maior a idealização maior o choque de realidade. Que choque!

 Vivemos a ilusão de que tudo será como imaginamos, que faremos tudo diferente do que nossos pais fizeram. Tudo muito fácil, lemos tudo, devoramos toda a informação e a realidade da vida é outra. Está aí a oportunidade! Em tempos de tanta mudança, tentamos adaptar, nos assustamos com o desconhecido, mas será essa a boa direção? Não seria melhor olharmos para a família como oportunidade formadora, mesmo com todas as mudanças a nossa volta?

Aqui começamos um processo enorme dentro de cada um de nós. Expectativa e realidade entram em choque e, é impressionante, como ao não nos abrirmos para a realidade, cairemos em armadilhas perigosas para a nossa família.

O primeiro ponto que precisamos falar é o quanto a nossa visão de ser humano interfere, tanto na compreensão da nossa própria história, quanto no nosso posicionamento como pais. 

É muito comum o entendimento de que nascemos puros e bons e toda a dor que experimentamos foi causada por algo que nos aconteceu. Neste sentido, compreendemos a dor como algo que poderia não estar lá, caso tal situação não tivesse acontecido.

Essa perspectiva é muito presente na nossa geração de pais. É claro que com isso, não estou dizendo que não houve dor, porém como apresentarei mais para frente, na perspectiva de Viktor Frankl, todos nós nascemos com um vazio existencial. A dor habita a existência humana e todos nós a vivemos. Perante essa informação é possível olhar de outra forma para a educação.

Em paralelo, vimos surgir um mar de informações sobre educação e sobre o desenvolvimento da criança e adolescente.

O ponto é que enquanto éramos filhos feridos estávamos compreendendo a dor por essa perspectiva, mas quando nos tornamos pais, juntamos esse entendimento mais toda a informação que chegou e partimos para tentar garantir, controlar a caminhada dos nossos filhos, para que conseguissem aprendizado, sucesso, serem felizes, sem passar por desconforto e dor.

Partimos para a tentativa de fazê-los aprender sem aprender.

Achamos que basta deixarmos as crianças satisfeitas, felizes, que elas farão o que precisa ser feito. E na prática não acontece assim. E aí está a maior oportunidade de aprendizado na família. Temos, inclusive, a oportunidade de compreendermos nossa história como filhos também. O que fizemos com o que nos aconteceu nos pertence.

Neste sentido, saímos de um olhar muito comum em nossas relações. Saímos da tríade Vítima, Vilão e Salvador. Podemos compreender a nossa própria história a partir do melhor possível dos nossos pais, sua centralidade, seu coração falho, a experiência da vulnerabilidade que também experimentaram e o quanto, com toda a boa intenção, provavelmente, na tentativa também de controlar ou garantir, agiram da forma que nos fez pensar que toda a dor que experimentamos teve essa origem.  Então, se eles tivessem sido diferentes, dor não haveria. É a partir deste entendimento que nos propusemos a fazer diferente. Porém, quando encontramos nossos filhos, a vida real, as coisas não saíram como planejado.

 No fim das contas, esta é uma das experiências em que mais nos sentimos vulneráveis. Faremos o melhor possível, existe a parte do outro e aprenderemos pelo caminho. Essa é a vida de todos nós em família. E perante a vulnerabilidade a nossa primeira resposta é buscar controle.

Essa perspectiva (era a minha antes diga-se de passagem) nos leva como pais a termos um propósito equivocado na educação. Queremos garantir que os filhos darão certo, que serão felizes. E estamos em busca de, lá na frente, sermos vistos como bons. Mas temos um coração centralizado, queremos tudo no nosso controle. E como pais, chegamos até a pensar o que nossos filhos andando por aí dirão sobre nós. Com isso, precisamos que sejam ótimos, que já saibam, e nós exigimos já termos ensinado o que ainda estão aprendendo. Percebe o peso deste lugar? Queremos garantir através da própria tentativa de fazer por eles e do fazê-los fazer. Permissividade e força. Nestes dois polos, o aprendizado está longe de gerar autonomia, reponsabilidade, proximidade, verdade e de desenvolver atitudes na direção de uma bem maior ao invés do bem-estar imediato. Estamos na verdade, fragilizando os nossos filhos para a vida.

Quando partimos para controlar, vamos normalmente pela superproteção, pais fazendo, garantindo para que os filhos só acertem, consigam os melhores resultados, mimo! Perigoso!

Ao mesmo tempo em que partimos como pais para garantir e gerar conforto, há a expectativa de que esses filhos já façam o que precisa ser feito, sejam obedientes, mas nessa postura, atendidos, estão na verdade, aprendendo que tudo será do jeito deles. Eles também têm um coração centralizado, também querem o que querem.

Quando os pais se frustram de que mesmo deixando-os felizes não fazem o que precisa, ou mesmo, quando os pais se cansam de carregar tudo, vemos surgir a postura autoritária. Os pais que juraram que jamais usariam de força, acabam usando das estratégias de força para conseguirem o que querem.

 Usamos de castigos, gritos, ameaças, tapas, sermões, tiramos tudo da criança. A intenção é de que pela força, faremos com que façam o que é necessário. Agimos com irritação e descarga de força.

 Pais e filhos entram numa disputa de força para o banho de cada dia. Descarregam a frustração e a raiva e, as crianças, num primeiro momento, obedecem, mas em breve enfrentarão essa disputa.

 Em paralelo a isso, pais se culpam, porque leem que estão traumatizando os filhos. É nesta hora que vemos o pêndulo passar para o outro lado. Vemos surgir o agrado, a garantia, na intenção de reconquistar, não traumatizar e sermos amados por nossos filhos.

Ao mesmo tempo, além do agrado justificamos nossas atitudes, porque precisamos permanecer bons na imagem perante os filhos. Isso nos coloca em dois pesos e duas medidas, hipócritas.

 A gangorra entre permissividade e autoritarismo se instala e, em nenhuma das pontas, há a vida como ela é.

Viktor Frankl fala do vazio existencial, ou seja, todos nascemos com esse vazio. Não nascemos puros e bons, nascemos com um vazio e, com a escolha constante se seremos porcos ou santos com as nossas atitudes, perante o que nos acontece. Queremos o que queremos, do nosso jeito, nos nossos scripts e a essa condição chamei de coração centralizado. Pela cosmovisão judaico crista é nossa tentativa de sermos Deus.

Somos, portanto, vulneráveis, não temos o controle, nos enxergamos no centro com nosso coração centralizado, tentamos o controle e experimentamos o vazio existencial, da existência e, com ele, a necessidade de sermos amados. Somos imperfeitos, falhos. Criamos justificativas para os nossos erros, somos exigentes com os erros alheios, hipócritas, nos escondemos na persona, na imagem que pensamos necessária para parecermos perfeitos e assim, sermos merecedores de amor, reconhecimento, pertencimento e valor. Colocamos na performance o nosso valor e fazemos o mesmo com os nossos filhos. E mais, nossos filhos andando por aí, pensamos dizer sobre nós, não dizem, mas isso nos chama ainda mais a tentativa de controle.

Compreender esse ser humano que somos, muda tudo! Isso porque a dor, o vazio existe e existiria em nós de qualquer forma, nos nossos filhos também. Claro, que nossa educação pode aumentar ou acolher esse vazio, mas o ponto dentro desta perspectiva não é mais sobre não doer, é sobre não doer sozinho e, sobre a escolha de quem seremos nós perante o que nos acontece.

Esse entendimento de ser humano nos coloca em outra posição perante os nossos filhos e a educação deles. Então, se considerarmos que nossos filhos nascem com um vazio existencial, com coração centralizado, a educação passa a ser sobre acompanhar o voo e usar de todas as oportunidades como porta de aprendizado. Aprendizado na direção de descentralizar o seu coração, chamá-los à autonomia, à responsabilidade, à entrega no melhor possível e ao aprendizado com seus acertos e erros. Chamá-los a humildade de quem não é melhor que ninguém, chamá-los para amar e compreender.

Não é sobre garantir nem fazer acontecer na força do adulto. Não é sobre parecermos perfeitos e nossos filhos também.

 É sobre viver e usar de tudo o que acontece na realidade da vida para chamarmos nossos filhos a boa resposta perante a vida. Voar do lado deles.

Viktor Frankl apresenta em sua obra a sustentação no Supra sentido da vida, o transcendente, Deus. Somos capazes de agir como porcos ou santos e temos escolha perante todo e qualquer estímulo a respeito de quem seremos nós nesta circunstância. Sustentados pelo sentido último, pela fé, por Deus.

Todo este conhecimento da logoterapia é importante para que percebamos que, sustentados pelo Amor que nos Amou primeiro, pela Graça é possível exercer nossos talentos e dons, nossa humanidade na direção do servir, do amar, do sentido último que tanto dá sentido a existência, à vida, à vontade de seguirmos no propósito, na missão a que fomos chamados. Amamos sem nos abandonar. Amamos de fato, sem contracheque.

Como diz Viktor Frankl no seu livro em busca de sentido:

“O ser humano não é uma coisa entre outras; coisas se determinam mutuamente, mas o ser humano, em última análise, se determina a si mesmo. Aquilo que ele se torna – dentro dos limites dos seus dons e do meio ambiente – é ele que faz de si mesmo. No campo de concentração, por exemplo, nesse laboratório vivo e campo de testes que ele foi, observamos e testemunhamos alguns dos nossos companheiros se portarem como porcos, ao passo que outros agiram como se fossem santos. A pessoa humana tem dentro de si ambas as potencialidades; qual será concretizada, depende de decisões e não de condições.”
“Nossa geração é realista porque chegamos a conhecer o ser humano como ele de fato é. Afinal, ele é aquele ser que inventou as câmaras de gás de Auschwitz; mas ele é também aquele ser que entrou naquelas câmaras de gás de cabeça erguida, tendo nos lábios o Pai-nosso ou o Shem Yisraet.”

 Nossos filhos estão aprendendo não são robôs programáveis. E nós sairemos da hipocrisia dentro de casa. Porque exigimos que já saibam e nossos erros estão sempre justificados. Nós também estamos aprendendo com os nossos acertos e erros.

            Como você age quando erra?

Sermos de verdade e vivermos a vida de verdade inclui fazermos o melhor possível aprendermos com nossos acertos e erros todos os dias e pedirmos perdão quando necessário.  Quando tudo isso mudou na minha casa a minha filha mais velha me disse que agora éramos próximas, porque ela podia me contar dos acertos e erros porque eu agora ouvia a ela do lugar de quem também erra.

 Neste sentido, nossos filhos vão doer, passar desconforto e nós, estaremos ali para acolher, afinal, passamos por isso todos os dias, estamos todos aprendendo e seremos potência para chamá-los a viver as consequências, educar com aplicação de consequência e chamá-los a aprender com os acertos e erros que irão cometer.

 O desconforto, o erro, o fracasso farão parte. Vamos vê-los doer, mas quando nos encontramos e os chamamos a aprender com as dores, veremos os valores, as escolhas, a responsabilidade, a autonomia, o respeito, tudo sendo desenvolvido pelo caminho. E com isso, veremos também acertos e vitórias e, não teremos sido nós quem as conquistou e sim, eles mesmos, por eles mesmos.

 A educação no fim é muito mais profunda do que comportamento, estamos educando o coração. Descentralizando o coração, saindo do centro da vida. Saindo do bem-estar imediato e indo na direção do bem maior que requer a boa postura, esforço, comprometimento e fé.

 Neste aprender de todo dia, o amor que não está em questão, ou na performance, o valor não está nos resultados. O amor já é. Enquanto estão nos resultados, vivemos a escravidão em busca da perfeição e com os filhos também. Essa postura nos retira e retira os filhos do aprendizado, porque no fim, sempre culpamos algo ou alguém pelas falhas.

Os resultados são, na verdade, informação para a próxima vez! Fonte de aprendizado!

 Na garantia ou no fazer eles fazerem o aprendizado é outro. Alguém sempre vai resolver para mim, não tenho responsabilidade nenhuma sobre o que faço, ou só faço algo quando a força vier. Portanto, não há responsabilidade nem autonomia sendo desenvolvidas. Veremos crescer nesta lógica a hipocrisia, a mentira, a distância entre nós.

Vamos nos nossos encontros sair destas duas pontas e aprender como usar das oportunidades como aprendizado com estratégias de correção que chamam a crescer.            

Compreender quem é de fato o ser humano faz toda a diferença em como compreenderemos a vida em família.

Somos ferro afiando ferro. Somos seres humanos falhos convivendo e cada um querendo que o mundo nos obedeça e, descobrindo juntos que não é assim que funciona. Esse processo nos levará a aceitação da vida como ela é, aceitação do outro e a melhores caminhos para que haja consideração entre nós.  Veremos transformadas as nossas relações com o próximo, conosco e com Deus.

Na centralidade queremos que o outro seja o que queremos que seja. E o outro quer o mesmo. O presente, ao sermos pais e mães, é que viveremos isso com nossos filhos e, neste imenso amor, seremos chamados a nos transformar.  

Quem seremos nós perante a vida que se apresenta? Quem seremos nós perante a oportunidade de aprendizado que vivemos em família, porcos ou Santos?

             Nossa vida consiste em: só por hoje, fazermos o melhor possível, entregarmos excelência, aprendermos com os acertos e erros e, caso tenhamos despejado a frustração em alguém, pedirmos perdão! Essa postura nos aprimora e podemos acompanhar nossos filhos nesse caminhar! Olharemos nossos filhos pela mesma misericórdia que tanto necessitamos e, com ferramentas que chamam a crescer veremos o ser humano lindo que irão se tornar. Lindos por que serão perfeitos? Não, lindos perque terão a postura correta perante a vida, abertos a aprender, a cuidarem da sua parte sustentados em bons princípios, valores e abertos a crescer em amor.

Quanto ao que passou, podemos trazer ao momento presente reconhecendo nossas falhas e violências e seguindo no presente em arrependimento e perdão. Nesse   movimento, restauramos, curamos, trazemos movimento às nossas experiências, mas     perceba: só é possível fora da premissa e da exigência de perfeição.

 Há paz no aprender, há paz no perseverar, há paz na esperança. Eu te convido a render-se e a deixar a paz entrar. Eu te convido a perseverar no seu melhor possível hoje e a cuidar de tudo que sai de você na melhor forma possível. Eu te convido à responsabilidade da sua atitude hoje. Eu te convido ao arrependimento e perdão capazes de restaurar hoje e todo o seu passado antigo e recente. Com esse movimento vivo, todo e qualquer desafio que ainda permanecerá em nossas vidas poderá ser vivido de um lugar de paz e de jamais solidão.

Vamos acompanhar o voo dos nossos filhos diariamente pela porta do amor, da compreensão e sendo semente potente de aprendizado.

Em amor, vamos aprender, crescer, transformar primeiro a nós mesmos para depois vermos toda a nossa casa sendo transformada pela semente potente que seremos.

Formaremos filhos fortes, justos, corretos, responsáveis, autônomos, humildes, abertos a aprender, misericordiosos, repletos de bons valores e princípios. Eles serão boas sementes por onde forem!

Com amor, Dani

Daniella Freixo de FariaÉ psicóloga formada pela PUC-SP, especializada em Psicologia Analítica, Transpessoal e cursos de extensão na familiar sistêmica. Hoje segue orientada pela terapia familiar sistêmica, pela obra de Viktor Frankl, pela comunicação não violenta e sustentada pela cosmovisão cristã. Além de atender pais e filhos, ministra palestras, desenvolve mentorias e cursos on-line para pais e profissionais. Além de compartilhar dicas e estratégias para educação dos filhos em seu canal do Youtube com os mais de 400.000 inscritos.

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