
O mês de agosto tornou-se o Mês da Primeira Infância após a sanção da Lei nº 14.617, em 2023. A iniciativa, criada para dar visibilidade e promover políticas públicas voltadas às crianças de zero a seis anos e suas famílias, é mais do que uma campanha. É um lembrete poderoso de que o cuidado nos primeiros anos de vida molda, em grande parte, quem seremos como adultos.
A neurociência já comprovou que os primeiros mil dias de vida – do início da gestação até os dois anos de idade – representam uma janela de oportunidade única para o desenvolvimento integral. Crianças que crescem em ambientes seguros, com vínculos afetivos consistentes e estímulos adequados, têm maiores chances de se tornarem adultos saudáveis, autônomos e resilientes.
Por outro lado, a ausência de cuidados básicos, a negligência, a violência, a insegurança alimentar ou emocional nesse período pode deixar marcas profundas, com impactos duradouros: dificuldades de aprendizagem, transtornos de saúde mental, baixa autoestima e maior propensão a comportamentos de risco.
Mas garantir esse cuidado não é responsabilidade apenas das famílias. Trata-se de um compromisso coletivo. As instituições de ensino da primeira infância, por exemplo, têm a responsabilidade de oferecer um ambiente estruturado, seguro e acolhedor, onde as crianças possam se desenvolver por meio do brincar, da convivência e da descoberta. É nesses espaços que aprendem a compartilhar, cooperar, lidar com frustrações e construir laços fora do círculo familiar.
Políticas públicas que assegurem um pré-natal de qualidade, acesso à educação infantil, segurança alimentar, apoio parental e espaços seguros para convivência e brincadeiras são fundamentais. As interações com familiares e cuidadores são especialmente valiosas nesta fase, quando o cérebro da criança está formando conexões neurais essenciais para o aprendizado futuro.
É também nesse período que as crianças começam a entender e expressar emoções, estabelecem vínculos afetivos e aprendem a interagir com o mundo ao seu redor. Essas habilidades são a base para relacionamentos saudáveis e para a construção de uma vida emocional equilibrada.
Importa lembrar que toda criança tem potencial, independentemente do contexto em que nasceu. Mas esse potencial só se desenvolve plenamente quando há condições adequadas. Os primeiros anos de vida influenciam diretamente a saúde, o desempenho escolar, as relações sociais e até mesmo a trajetória profissional no futuro.
Essa não é apenas uma questão de cuidado ou sensibilidade, é também uma questão de inteligência social e econômica. Em 2000, o economista James Heckman recebeu o Prêmio Nobel ao demonstrar que investir na primeira infância traz os maiores retornos sociais e econômicos. A chamada Equação de Heckman mostra que programas de desenvolvimento integral — que combinam cuidados, educação e saúde — são capazes de romper ciclos de pobreza e exclusão, promovendo uma sociedade mais justa e produtiva. Mais do que uma campanha, o Agosto Verde é um chamado à responsabilidade coletiva. Investir na primeira infância é agir no presente para transformar o amanhã. ele começa no colo de quem cuida, nas palavras que acolhem, no olhar que valida. Começa na rotina das famílias, no empenho dos educadores, na responsabilidade compartilhada por toda a sociedade. Ver a criança como prioridade é entender que cuidar da infância é construir, desde já, uma sociedade mais equilibrada, solidária e cheia de possibilidades.
Ariane Denti Lucietto – Professora Formada em Letras com Especialização em Literatura e Ensino. Associada da Escola de Pais do Brasil – Seccional de Chapecó
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