Quando nos deparamos com uma estatística cujos dados nos informam que em cinco dias, nas rodovias federais, morreram aproximadamente 190[1] pessoas, podemos pensar tratar-se de uma estatística falaciosa, afinal, seria a morte de 38 pessoas por dia, ocorrência de mais de uma por hora. Mas não é fantasia, é a pura realidade estampada nos noticiários pós-carnaval 2011. E então refletimos: mas como? Por quê? De que forma estes acidentes ocorreram?
Diversas associações podem ser feitas a esses cincos dias. Vejamos: festa nacional associada a bebidas alcoólicas e feriado prolongado que leva mais pessoas estarem nas rodovias. Sim, estes são dois fatores importantes, mas não são eles os fatores de maior incidência. Também associado a esta carnificina nacional, temos ainda o excesso de velocidade, o desrespeito às regras de trânsito e principalmente a imprudência. E nesta esteira de reflexão perguntamos: de quem é a culpa? Da polícia que não fiscaliza? Da rodovia que não tem manutenção adequada? De quem? Bom, bastante simples é apontar culpados, difícil é assumir a culpa.
O trânsito é feito de veículos automotores e pessoas. Quem comanda quem nesta interação? Sabemos que são as pessoas e então continuamos refletindo: quais são os fatores que levam um condutor a se tornar alguém imprudente e que não obedece as regras de trânsito? Pois bem, tracemos uma linha imaginária da vida de nós mesmos. Uma primeira pergunta já nos ocorre: onde e quando temos nossas primeiras experiências no trânsito? Quando bebês, somos transportados no colo de um adulto. Temos aí o primeiro vício e quebra de regras instalado. Associamos aquele colinho gostoso e carinhoso daqueles que nos amam ao movimento do veículo, buzinas e gritaria de trânsito. Bebês devem ser transportados em bebê-conforto, afivelados em cinto de segurança, essa é a regra.
Depois, quando já andamos e temos condições de perceber mais o mundo e de nos movimentarmos não aceitamos mais ficar “amarrados” na cadeirinha. Diversos pais se rendem às birras e reclamam que não conseguem deixar seus filhos em segurança dentro do carro, porque as “crianças não querem”. Ora, quem manda são as crianças ou os pais? Então, as crianças já aprendem que mandam e que podem “burlar as regras”. E tem mais, além de perceberem que podem burlar as regras, se dão conta a olhos vistos que seus pais também não usam cinto de segurança, furam sinais de trânsito, xingam com palavrões outros condutores, dirigem após ingerirem bebidas alcoólicas. Tem pais ainda que amedrontam as crianças quando próximos de policiais, como se esses servidores da sociedade fossem vilões.
Então, diante de toda essa escola de trânsito que a criança acompanha no seu dia a dia junto de seus pais, não é difícil inferir como será este adolescente quando tiver a oportunidade de estar conduzindo um veículo. Essa escola que se tem dentro da família, na linguagem subliminar, nos exemplos, nas ocorrências reais do dia a dia fica arraigada neste pré-adulto, fica grudada na sua motricidade, embutida sonoramente no seu inconsciente. Ele reproduzirá com fidelidade aquilo que foi preparado.
Para temperar toda essa sucessão de irresponsabilidade dos pais, alguns ainda oferecem aos seus filhos menores a possibilidade de que pilotem os veículos sem que ao menos tenham licença para tal. Entregam suas máquinas maravilhosas e velozes nas mãos de adolescentes imprudentes e inconsequentes. As regras, as leis são literalmente jogadas na lata de lixo, varrida para debaixo do tapete.
E depois de muito refletir, nos questionamos: precisamos de mais fiscalização, de mais policiais, de mais legislação? Talvez. Porém, por mais que se fiscalize, que se crie regras, de nada adiantará se não tivermos dentro de nós e ensinado aqueles sob os quais temos responsabilidade, que as regras existem para que sejam cumpridas. Não teremos jamais fiscalização a cada quilômetro. Educação é algo que se cultiva, que se cria nos seres humanos a partir daquilo que captamos com nossos sentidos. Precisamos educar nossos filhos para as regras da vida em sociedade. Um trânsito seguro e com paz se faz com educação e não somente com punições.
Referência
1) Dados da Polícia Rodoviária Federal, Operação Carnaval 2011 – 05 a 09 de Março.
Este artigo foi publicado na Revista nº 3, p. 35, da Escola de Pais – junho de 2011.
Naiara Vicentini – Psicóloga, Graduada em Direito
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