Se espremermos a fruta da vida, o suco, o resultado final de cada ação, de cada interesse que nos motiva serão duas coisas: SAÚDE e FELICIDADE. Buscamos incessantemente esses dois resultados.
E falo, aqui, da saúde física, biológica, aquela que nos mantém razoavelmente autônomos. Não a toa que, quando perguntados como está indo nossa vida costumamos responder “Tendo saúde, o resto se dá jeito”. Queremos SAÚDE. E, queremos saúde pela singela razão de que temos pavor da ideia de depender dos outros. Por que nutrimos esse pavor? Porque as relações que estabelecemos (e que estabelecem conosco) não transmitem confiança. Lamento lhe dizer isso, querida leitora, dileto leitor. Sei que você, agorinha, deve estar pensando “Só se as tuas relações não transmitem confiança, porque as minhas….”. Esta bem,vou aliviar: a esmagadora maioria das relações que estabelecemos não são confiáveis (menos as tuas, que agora me lê). Nós, humanos, somos seres difíceis, contraditórios, infantis. Nossas pretensões de justiça, bondade, tolerância não arranham uma folha de papel manteiga.
Portanto, um de nossos objetivos na vida é termos, mantermos ou recuperarmos a saúde, para que tenhamos a mínima autonomia de vontade aliviando a miséria da dependência.
A outra razão de ser da vida é a FELICIDADE. O problema é que na palavra felicidade cabe tudo, cabe qualquer coisa. Cabe querer coisas aceitáveis, como também as inaceitáveis. Cabe obter resultado pelo trabalho, como pelo roubo. Enfim, “felicidade” é uma palavra aberta, razão pela qual temos de ter algum foco quando buscamos a tal felicidade. Contudo, ouso sintetizar a felicidade como sendo um estado de espírito caracterizado pela percepção de que somos SUJEITOS de nossa existência, e de que possuímos uma estabilidade espiritual.
Foi tentando responder à pergunta “O QUE TORNA A VIDA FELIZ” que um grupo de pesquisadores da Universidade de Harvard iniciou, em 1938, um estudo para identificar que tipo de comportamento resultaria em estados de felicidade. Os pesquisadores selecionaram 724 jovens ( 17 anos), todos homens. Metade (362) era da Classe “A” estadunidense. Gente rica, gente com famílias aparentemente estáveis. A outra metade foi recrutada entre garotos dos guetos de Boston (EUA). Gente pobre, gente com família desestruturada. Pai alcóolatra, mãe presa, etc.
O estudo, que continua até os dias de hoje, acompanhou o desenrolar da vida desses garotos. Inserção no mercado de trabalho; casamento; filhos; doenças; riqueza, pobreza. Todas as circunstâncias da vida avaliadas. Tudo era acompanhado meticulosamente por meio de exames médicos anuais, longas entrevistas, filmagens do cotidiano desses homens, até seus últimos suspiros. O mais alentado e longo estudo já feito sobre o dia a dia de homens comuns.
Quando os estudos já alcançavam quatro décadas, os pesquisadores, gente culta, gente inteligente, gente que só fazia isso, com base na imensa massa de dados que já tinham coletados, resolveram fazer uma projeção para saber quais daqueles homens chegariam mais saudáveis, e com mais percepção de felicidade ao termo da existência. Cruzaram dados, fizeram cálculos e definiram o grupo que, no entender deles, era mais saudável e feliz.
Mas, ELES ERRARAM! O grupo de homens que chegou à velhice com mais saúde física, com mais memória, com menos doenças degenerativas (Parkinson, Alzheimer, etc), foram os homens que tinham construído RELAÇÕES. Relações amplas, relações que extrapolavam o núcleo familiar estrito (marido, mulher e filhos).
Sim, as milhares e milhares de páginas de dados coletados apontaram que as pessoas que tinham estabelecido relações com seus familiares, com sua comunidade, com sua igreja, enfim, pessoas que DISPONIBILIZAVAM parte de sua vida para OUTRAS vidas eram mais saudáveis e mais felizes.
Contudo, não basta estabelecer relações (até porque, basta nascermos para já estabelecermos relações). As relações devem ser SAUDÁVEIS. Relações saudáveis é que nos tornam mais saudáveis e mais felizes.
Basicamente, uma relação pode ser considerada saudável se ela não está fundamentada no medo, no interesse, ou, na necessidade. Se uma relação, seja ela amorosa, profissional, comunitária, religiosa, está fundamentada no medo, na necessidade ou no interesse, esta relação está fadada ao fracasso.
O segundo ponto que caracteriza uma relação saudável é se ela é acolhedora, ou seja, se você está nela pelo sentido de PERTENCIMENTO, que é uma palavra bonita e sonora para dizer que você está ali porque se SENTE dali. Se a relação te faz sentir acolhido, acolhida no sentido mais amplo da palavra (tem de acolher erros também, senão não vale), então há aí um bom indicativo de que esta relação é saudável.
O terceiro indicador de uma relação saudável é se você se sente ANDANDO dentro dela. Só relações saudáveis nos permitem caminhar dentro delas, nos permitem perceber que estamos indo do ponto “A”para o ponto “B”, que estamos nos tornando pessoas melhores. Mas, não o melhor pretendido pelo outro da relação, e sim, o melhor percebido e querido por você. Sim, você, “vocezinho da silva”. Você é SUJEITO da relação. Todos o são.
Isso significa que uma relação saudável não tem desavenças, contrariedades, dores, traições, e coisas amontoadas!? Claro que tem! Não percamos de vista que, como dito lá atrás, somos pessoas difíceis, infantis, cheios de medos, medinhos e pavores.
Entretanto, o fato de compreendermos minimamente quem somos nos permite agir com discernimento. Um discernimento que tem de ser trabalhado com afinco (como tudo nessa vida, até o amor, tudo é aprendido). Há que se ter um desejo mínimo de você gostar de você, de querer se ouvir, ouvir a vida (no dizer de Viktor Frankl).
Nascemos para nos tornarmos pessoas inteligentes e moralizadas (aqui, no sentido mais humano possível). Para desenvolver a inteligência temos de nos apropriarmos o quanto possível de toda atividade que desenvolvemos, seja um projeto de engenharia espacial, seja o lanche que o filho leva para a escola. A atividade do trabalho nos permite desenvolver o intelecto. É o intelecto que fortalece o senso crítico. É o senso crítico que dá voz ao SUJEITO da relação. Sem senso crítico, você será conduzido, conduzida, pela mão, feito criança imberbe.
Já a moralidade, esta se desenvolve justamente por meio da refrega, do contato entre pessoas. Não se desenvolve paciência, tolerância, diversidade, solidariedade, com pedras nos rochedos escuros do Himalaia.
Portanto, minha cara, meu caro, a saúde e a felicidade estão ao alcance da sua mão, estão dentro do seu dia, da sua vida. Elas são resultado da qualidade das relações que você estabelece, da qualidade que você dá às suas relações. É o contato humano, com todas as suas dificuldades, que dá substância à vida. Agora, eu te pergunto: E você não sabia disso? Sabia, né?!
Publicado na Revista Escola de Pais do Brasil – Seccional da Grande Florianópolis – out 2017, p. 31.
Walterney Ângelo Reus – Advogado e Procurador do Município de Içara – SC
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