Pensar vinte vezes antes de castigar um filho

O único castigo eficaz é a surra verdadeira, se possível com chicote. Não porque corrija um erro ou eduque. Ensina a ter medo do chicote. Um psicólogo pode se esmerar e aumentar o medo ao chicote. Os pais, na tentativa de oferecer a educação ideal a seus filhos, fazem todas as vontades das crianças, acham que uma palmadinha resolve qualquer birra e insistem em esconder dos filhos seus problemas de relacionamento. Os pais com muita ansiedade, extremamente autoritários, exigentes ou superprotetores é que devem ser levados a um psicólogo, antes de partirem para o chicote.

O fato atual é que as mães que trabalham fora têm aumentado o número de castigos físicos a seus filhos.

O trabalho da mulher é uma realidade que não tem volta. Considero o primeiro ano de vida importantíssimo. Seria ótimo se a mãe conseguisse ficar pelo menos durante todo o primeiro ano com o bebê. Países como a Polônia, da extinta União Soviética, e Dinamarca, que querem aumentar a sua natalidade, concedem por lei ate dois anos de licença-maternidade. A nossa Constituição é a primeira que dá à criança o direito de ter a mãe com ela pelo menos durante quatro meses. Se somar as férias, já são cinco, quase meio ano. Isso já é bom.

Os pais deveriam ser proibidos de levantar a mão para bater nos filhos. As mães às vezes se assustam e perguntam: “Mas nem um tapinha na bunda?” Não. As mães não corrigem um ato errado quando batem. Elas batem porque estão nervosas e irritadas, e a criança percebe que é ela, criança, que está sendo agredida. Esse sentimento é de uma injustiça terrível. O castigo físico tem que ser eliminado da educação.

SE O CASTIGO FÍSICO DEVE SER ELIMINADO, O QUE RESTA?

Há vários castigos que são ótimos quando a criança quebra a disciplina. Deixar de assistir televisão, sentar em um canto para pensar no que fez, tirar mesada. ?Esses são castigos de ótimos resultados.

A birra é um sentimento que a criança manifesta quando está frustrada. É como se ela tentasse se livrar dos males que o mundo obrigatoriamente vai lhe dar. Até os três anos e meio a birra é natural e não se deve fazer nada a não ser esperar a crise se esgotar. Pense 20 vezes antes de bater.

1. Bater em alguém mais fraco é em si um ato de covardia.

2. A palmada tende a perder seu efeito a longo prazo e a criança aos poucos teme menos a agressão física. A tendência dos pais é, então, bater mais e mais, buscando os efeitos que haviam conseguido anteriormente.

3. A palmada não resolve os conflitos comuns às relações pais e filhos: muitas das crianças que apanham, mesmo sentindo-se magoadas e amedrontadas, enfrentam os pais dizendo que a “palmada não doeu”, e o que era apenas um tapinha leve no bumbum, acaba virando uma tremenda surra.

4. A palmada, aos poucos, pode afastar severamente pais e filhos, pois a agressão física, ao invés de fazer a criança pensar no que fez, desperta-lhe raiva contra aquele que a agrediu.

5. Os danos emocionais impostos pela agressão física são geralmente mais duradouros e prejudiciais que a dor física.

6. Bater pode ser uma experiência traumática para a criança não apenas pela dor física que impõe, mas principalmente porque coloca em risco a credibilidade depositada por ela nos pais que é a base para sentir-se amparada e segura.

7. A criança não pode se sentir segura se sua segurança depende de uma pessoa que se descontrola e para com a qual tem ressentimentos.

8. A criança que apanha tende a se ver como alguém que não tem valor.

9. Aos poucos a criança aprende a enganar e descobre várias maneiras de esconder suas atitudes com medo de punição.

10. A criança pode aprender a mostrar remorso para diminuir sua punição, sem no entanto senti-lo realmente.

11. Para a criança a palmada anula a sua conduta: é como se ela tivesse pago por seu erro, e por isso pensa que pode vir a cometê-lo de novo.

12. A palmada não ensina à criança o que ela pode fazer, mas apenas o que não pode fazer, sem que saiba ao menos o motivo. A criança só acredita ter agido realmente errado quando alguém lhe explica o porquê e quando percebe que sua atitude afeta ou abala o outro.

13. O medo da palmada pode impedir a criança de agir errado, mas não faz com que ela tenha vontade de agir certo.

14. A palmada tem um caráter apenas punitivo, e não educativo; ela pode parecer o caminho mais fácil a ser seguido, porque aparentemente tem o efeito desejado pelos pais. É comum a criança inibir o comportamento indesejado por medo, e não pela convicção de que agiu de maneira inadequada.

15. Muitas das crianças que apanham aprendem a adquirir aquilo que querem através da agressão física e, não raras vezes, apresentam na escola condutas agressivas para com os colegas.

16. Uma palmada, para um adulto, pode parecer inofensiva. Porém é importante saber que cada criança atribui um significado diferente ao fato de “levar umas palmadas”, podendo tornar-se uma experiência marcante em sua vida futura. Além disso, independente da intensidade de bater, o ato continua sendo o mesmo: um ato de violência contra um ser desprotegido.

17. Bater é uma forma de perpetuação da “cultura da violência” tão presente nas relações entre as pessoas nos dias atuais, pois ensina às crianças que os conflitos se resolvem por meio de agressão física.

18. Bater nos filhos muitas vezes acaba por gerar nos pais fortes sentimentos de culpa, o que leva a procurar compensar sua atitude posteriormente, “afrouxando” aquilo que procuravam corrigir.

19. Bater é um atestado de fracasso que os pais passam a si próprios (Zaguri, 1985) porque demonstram para a criança que perderam o controle da situação.

20. O sentido da justiça está em fazer aos outros aquilo que gostaríamos que nos fizessem. Quando nós, adultos, agimos de maneira inadequada, não esperamos punição. Esperamos sim que as pessoas nos compreendam e nos ajudem a agir de maneira certa.

Como você pode ter percebido existem muitas razões para não bater muna criança. Agora imagine: se umas simples palmadas podem trazer consequências tão danosas, o que dizer daquelas surras que acabam virando uma verdadeira pancadaria?

Alguns autores citam como consequência da violência física contra a criança e adolescente:

– Autoestima negativa;

– Comportamento agressivo;

– Dificuldades de relacionamento;

– Dificuldades em acreditar nos outros;

– Infelicidade generalizada;

– Retardamento mental.

Mas se a palmada é um recurso tão inadequado para resolver os problemas que surgem diariamente na relação pais e filhos, o que podemos usar no lugar dela? Vamos conversar sobre isso na Escola de Pais.

Este artigo foi publicado na Revista Dimensão nº 46 – setembro de 2006, p. 31-32. É uma publicação da Escola de Pais do Brasil – Seccional Florianópolis.

Haim Grunspun – Psiquiatra, psicólogo clínico, bacharel em direito e professor da PUC-SP, Membro do Conselho de Educadores da Escola de Pais do Brasil

1 Comentário

  1. Gostei do artigo, estou passando por essa experiência atualmente e já teve momento que perdi o controle e acabei dando palmadas na minha filha de 1 ano e meio, fiquei muito angustiada depois que não consigo repetir o ato, mesmo que a vontade venha. Ela é muito birrenta, sempre na hora de trocar a fralda acontece dela não querer deixar aí é o momento que preciso de mais paciência. Parabéns pelo artigo.

    Sandra.

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