NAVEGANDO NA CRIATIVIDADE DIANTE DO DESAFIO DE EDUCAR

Com o nascimento do primeiro filho, surge uma nova combinação com a transformação de um casal em uma nova família. Enquanto casal, cada um administra sua própria vida tanto individual quanto relacional, de forma a preservar a tão desejada união conjugal. Não é uma tarefa fácil porem não tão difícil quanto a chegada de um filho, uma nova vida a administrar que depende de ambos, incorporando outras funções, tarefas e responsabilidades que requerem maestria e pouca tolerância no quesito eficiência e bom desempenho. Sem qualquer dúvida, educação é o maior desafio a enfrentar pelos geradores da família. Educar é construir valores ao longo do tempo cujo resultado surgirá em longo prazo. Fala-se da “arte de educar”, mas penso que educar vai além da arte, é uma tarefa complexa, diária e permanente, cujos desafios são vencidos sistematicamente.

A realidade que hoje vivemos exige muito mais da função de educar onde valores rapidamente são destruídos, reconstruídos e criados, revelando a necessidade de sermos sensíveis a tais transformações e criativos quanto ao desempenho das funções inerentes ao educador, sem contudo nos afastarmos da realidade que nos cerca. A criatividade é fundamental pois só com ela conseguimos superar a maioria dos nossos problemas. Muitas vezes nos bloqueamos por comodismo ou por receio de cometermos erros, talvez por falta de confiança em nossas ideias. Porém, devemos ter em mente buscar motivação para influenciar positivamente em nossa habilidade de sermos criativos, em detrimento de sermos dominados por este bloqueio.

CRIATIVIDADE NO AMOR

O amor com afetividade é de grande importância para o desenvolvimento emocional e cognitivo das crianças e dos adolescentes. Cada um tem sua própria linguagem para se comunicar pelo coração, de forma a ser mais facilmente compreendida e decodificada pelos sentidos, acessando o outro integralmente. A comunicação do amor explícita e efetiva registrará um sentimento de segurança no processo de crescimento, aprendizagem e amadurecimento. Este sentimento revela que o amor inteligente nem sempre aceita tudo, que o limite existe e a responsabilidade deve ser exercida. O amor precisa ser demonstrado e compreendido por quem o recebe: “porque eu te amo é que eu não aceito isso de você”.

Para Gary Chapman (conselheiro de casais e professor) e Ross Campbell (conferencista e professor de pediatria e psiquiatria), são 5 tipos mais importantes de linguagem do amor: contato físico (abraçar), palavras de apoio (“vai ficar tudo bem”), tempo de qualidade (marcar presença), presentes (receber e distribuir), atos de serviço (querer ajudar). Não importa qual o tipo de linguagem e sim o nível de comunicação do amor, o respeito e a confiança. Como anda esse processo em sua família? Ambientes onde a comunicação é precária ou inexistente tendem a intensificar qualquer distúrbio que possa ocorrer, principalmente em crianças e adolescentes.

CRIATIVIDADE NA AUTONOMIA

Nas grandes famílias dos antepassados imigrantes, desde cedo os filhos costumavam assumir responsabilidades nas atividades diárias tais como lavoura, no cuidado com os animais, na cozinha, no comércio, na criação de irmãos menores, além de frequentarem a escola e fazerem suas tarefas escolares. A ideia não era simplesmente ajudar os pais ou incorporar uma nova forma de brincar, mas também de responsabilidade distribuída. Os desafios reais aos quais estavam expostos ajudavam a buscar estratégias de solução e a desenvolver suas próprias habilidades, sejam na matemática, negociação, culinária, atividade de coordenação motora, saúde, etc. Assim havia um estímulo natural ao desenvolvimento de inteligências múltiplas, sem internet nem celular.

Nos dias de hoje pensamos que para ser alguém na vida, as crianças e os adolescentes têm que estudar, o que é verdadeiro, porém, devem também ser estimuladas a desenvolver sua inteligência na prática de resolução de problemas da vida diária, considerando sua faixa etária e grau de maturidade. Não aprendendo a lidar com frustrações, adversidades, mudanças inesperadas e resiliência, dificilmente terão desenvolvidas a iniciativa, flexibilidade, determinação, empatia e coragem na fase adulta. No estilo de vida atual, estamos criando oportunidade para nossas crianças e adolescentes trabalharem sua inteligência múltipla? Autonomia e independência se aprende em casa, portanto, com criatividade devemos estimular neles a capacidade de resolver problemas desde cedo.

Com algumas tarefas domésticas podemos criar estímulos neuro lógicos com foco na concentração, planejamento, memória, priorização, mudança de planos e responsabilidade. Desde pequenos, 2 a 3 anos, tarefas domésticas como arrumar e guardar brinquedos, despachar lixos corretamente (orgânico e reciclável), buscar alimentos acessíveis como frutas e lanches, limpar mesinhas. Assim, sucessivamente com a evolução da idade, guardar roupas e sapatos nos locais apropriados, arrumar compras de supermercado, colocar e retirar roupa do varal e depois dobrar e arrumar no armário, trocar roupa de cama e banho, preparar refeição simples, elaborar lista de compras do supermercado, por roupa para lavar, levar o lixo para o local de coleta, ajudar com irmãos mais novos, fazer pequenas compras em lojas que ofereçam segurança, etc. Enfim, uma infinidade de propostas que, com estímulo, podem ser executadas naturalmente sem que sejam rigorosamente executadas todos os dias, pois a ideia  é que se aprenda com a responsabilidade de um conjunto de tarefas específicas que fazem parte da vida real. Mesmo que tenhamos um profissional para exercê-las, não devemos negligenciar nossos jovens a oportunidade de se prepararem para uma vida real repleta de desafios, além de ser um importante diferencial no quesito inteligência múltipla.

CRIATIVIDADE NA APRENDIZAGEM

Frequentemente os adolescentes se queixam de dificuldades para estudar e conseguir boas notas. Muitas vezes não nos damos conta do ambiente, se é favorável ou não ao estudo e deixamos transcorrer como se isso não interferisse no rendimento esperado. Como se não bastasse nosso estilo de vida dominado pela mídia exagerada e muitas vezes irresponsável, a presença de barulhos traz consequências desastrosas, principalmente quando se trata de discussão entre os pais. As crianças são hipersensíveis a brigas e mesmo sendo através de gestos e insinuações, ela percebe. O processo de aprendizagem não flui bem num ambiente com estímulo punidor. Um ambiente desfavorável, barulhento e desorganizado faz com que crianças e adolescentes busquem prazer em outras atividades tais como jogos de vídeo games, smartphones e redes sociais. Os pais se queixam da falta de comprometimento dos filhos, mas não podem ser omissos quanto aos motivos. Se um modelo não for ensinado, torna-se difícil cobrar bons resultados. É necessário que haja diálogo e respeito além de compreensão, participação e colaboração dos pais.

Pensar nos desafios da educação nos faz levantar inúmeros questionamentos em torno deste tão amplo tema, onde muitos debatem e tentam fazer a diferença, enquanto outros nada fazem. Correndo em qualquer direção, todos buscam o velho “salve-se quem puder”. A verdade é que estamos enfrentando bruscas transformações de valores sociais e redefinição de papeis individuais e frequentemente nos deparando com barreiras sócio-político-econômicas, seja na escola, na família ou na comunidade onde vivemos. Precisamos confiar em nossas habilidades e cada vez mais navegar na criatividade diante do desafio de educar.

REFERÊNCIAS:

A importância da criatividade na Educação – site www.tutores.com.br

Vamos falar de amor? – Adriana Barbeiro

Autonomia e independência se aprende em casa – Adriana Vazzoler-Mendonça

Como estudar em um ambiente desfavorável? – Ádrinne Uchôa Dias

 

Ana Rosa Souza, formada em Processamento de Dados pela UFBA. Junto com seu esposo Anníbal Souza, participa da Escola de Pais do Brasil – Seccional de Salvador há 27 anos.

Publicado na Revista Escola de Pais do Brasil – 56º Congresso Nacional – 2019, p. 36-38.

 

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