Desafio da família no século XXI: violência ou paz?

Sempre que nos pomos a pensar sobre a paz, genericamente evoca algo distante e quiçá fora do nosso alcance.

É muito difícil para as pessoas quando este tema é trazido para a discussão, se imaginarem corresponsáveis de certa forma pela situação de violência a que estamos submetidos no mundo de hoje.

Há uma abstração marcante quando o assunto paz é tratado entre nós. Nos pontos de maior intensidade de conflito no planeta dos nossos dias, aparece sempre um questionamento das possíveis causas dos conflitos existentes. O poder econômico e a pobreza também são apontados como causas, enfim, cada um, segundo a sua percepção tenta tornar verdadeira a causa apontada que justifique tanta violência entre os humanos.

É estarrecedor ver e ouvir nos noticiários e periódicos dos homens bomba e mais recentes a atuação de mulheres, que oferecem a sua própria vida com objetivo de agredir os “possíveis inimigos”.

De onde vem esta convicção profunda de um ser humano que aceita morrer sabendo que sua morte trará como consequência a agressão e a morte de outros seres humanos? Será apenas um fanatismo, um idealismo social religioso explicaria?

O ser humano não é por natureza um ser agressivo. Todos nascem com iguais potencialidades para a agressão ou para a paz, para o amor.

No nascimento não somos humanos, nos tornamos humanos através de um processo educativo, que vai orientar um controle maior ou menor sobre a nossa agressividade instintiva, e estimular mais ou menos intensamente a nossa capacidade de amar (vocação para a paz). E isto tem a ver com o meio onde fomos criados, nossa cultura.

A família é a grande instituição humana capaz de fazer as grandes transformações no ser humano, na medida em que ela própria oferece satisfação das suas necessidades que serão a base para a construção de um ser humano: terno, amoroso, solidário, pacífico.

Na medida em que a família é incapaz de satisfazer as necessidades deste mesmo ser humano, permite que o seu instinto agressivo seja estimulado. Mas à medida que é a família, que além de não satisfazer as necessidades afetivas, trata com violência este ser humano e adota o relacionamento entre marido e mulher, pais e filhos, entre vizinhos, entre colegas de trabalho, enfim, a agressividade é o tom que permeia as relações inter pessoais nestas famílias, acaba-se transformando em verdadeira escola de violência.

É obvio que um ser humano que cresce e se forma nesse tipo de ambiente será mais facilmente atraído para ser agente violento no mundo selvagem dos humanos.

Além de tudo o que nos violenta como seres humanos no mundo que estamos inseridos e que indiretamente afeta nossos filhos, poucos conhecemos das necessidades básicas afetivas e por longos períodos ausentes da própria casa, transformamos a vida familiar num verdadeiro caos, pois para ela não temos, além de tudo, tempo.

É de extrema importância saber que a grande parte da estruturação de um ser humano ocorre nos seus primeiros anos de vida. A família é a única estrutura capaz de fazê-lo de forma mais adequada, o que depende muito da forma como esta família se estrutura, convive e vivencia seus próprios valores. A falta de amor está presente em qualquer circunstância e lugar onde a paz está ausente, ou seja, a ausência da paz.

A forma terna e afetiva com que nossos filhos são cuidados desde a concepção, seguida de uma atitude terna e afetiva no processo de educação passadas sem o uso de qualquer tipo ou forma de violência, implicará na real e verdadeira construção de um ser humano ou será a própria vítima da violência que ajudou a construir.

Enquanto escrevia estas ideias, tive a oportunidade de presenciar um noticiário que apresentou números estarrecedores de violência contra a mulher. No Brasil são registradas 240 agressões contra a mulher a cada hora, sendo que mais de 80% destas agressões são praticadas nos seus próprios lares, pelos maridos, companheiros, filhos e outras pessoas da família.

Mesmo nos países de primeiro mundo como nos Estados Unidos, a maior causa de mortalidade em criança de zero a cinco anos é a violência doméstica, onde os acidentes são presentes, mas a violência dos próprios pais ainda é a maior causa. Noventa por cento dos abusos sexual contra menores ocorre dentro da própria casa. É fácil perceber que sendo a família a grande alimentadora da paz, também é no sentido inverso, a grande fomentadora da violência.

A família de hoje, de forma geral, deixa muito a desejar nas suas ações em relação ao que delas se espera.

É necessário despertar e urgentemente trabalhar por uma nova família e por uma retomada de valores humanos que norteiam nossas ações no mundo, criando um novo estilo de vida, construindo no dia a dia um espírito de verdadeira paz.

 Publicado na Revista nº 1 – 2009 – Escola de Pais – Seccional de Biguaçu 

Cezar Augusto Detoni – Médico Gastroenterologista Clínico, Endoscopista, com formação em terapia familiar. Representante Nacional da Escola de Pais para o Rio Grande do Sul.

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