Um assunto essencial para refletirmos, pois faz parte do delinear cotidiano, é a procrastinação. Deixar de fazer as coisas, fazer depois o que poderia ser feito agora, adiar compromissos, deixar de ter aquela conversa com o filho ou o cônjuge pensando que poderemos tratar do assunto posteriormente. Não estamos falando necessariamente de tarefas complexas. Às vezes deixamos de fazer um simples telefonema ou pagar uma conta. Mas, de qualquer forma, são tarefas corriqueiras que podem se transformar em uma imensa dor de cabeça quando não feitas a tempo. Afinal, uma torneira não fechada pode virar um rio de preocupações.
Por que procrastinamos? O grande vilão é a preguiça. Tal assunto já foi esmiuçado na psicologia. Em um texto de Sigmund Freud denominado Inibições, sintomas e angústia, o pai da psicanálise sugere que a preguiça provém da inibição. E vários fatores que inibem. Teríamos, claro, que conhecer cada caso. Mas, de modo geral, podemos dizer que deixamos de fazer o que deve ser feito porque existe uma angústia ou um sofrimento por trás de cada afazer. E deixar para depois seria uma forma de o nosso organismo psíquico se defender das coisas com as quais não estamos preparados para lidar. Ou seja, é mais fácil de ter aquela conversa importante com o filho do que lidar com os problemas que o afligem hoje.
Quando? – Mas, será que deixamos de fazer só tarefas que podemos adiar ou também as importantes? Bem, é comum encontrar pessoas que digam “por que vou limpar meu quarto se amanhã estará sujo de novo?”. Mas é pouco comum escutarmos alguém indagando “para que vou beber água hoje se posso beber amanhã?”. O psicólogo norte americano Abraham Maslow criou um esquema simples para explicar a disparidade dessas necessidades. Segundo ele, a preguiça só aparece quando pode. No seu esquema, as necessidades básicas para a sobrevivência estão na base. Quando alcançadas, o ser humano alcançaria a autorrealização. Apesar da teoria de Maslow ser antiga e discutível, serve para pensarmos o quanto a preguiça existe com coisas que consideramos superficiais. Ou seja, é impossível pensarmos em nossa segurança, se não temos água para beber. A sede, afinal, não pode ser deixada para depois…
A procrastinação também é personagem de muitos dramas. Um deles… “Eu me arrependo de não ter dito todos os dias da minha vida para meu filho que o amava. Agora ele se foi sem ter escutado isso da minha boca.” Existe, portanto, um risco de perigo em deixar para depois algumas falas, a revelação dos sentimentos, pois o acaso nem sempre é perfeito em agir em nosso favor. Exemplos como o citado acima são ilustrações para atendermos que deixar para depois é uma servidão voluntária, uma submissão absoluta à nossa preguiça cotidiana. E a preguiça desorganiza nossa vida, nosso meio, nossa família e amigos. Podemos pensar essa organização como um espelho e isso já dizia um velho ditado: “Uma pessoa mal organizada externamente está desorganizada internamente”. Portanto, em vez de nos perguntarmos por que não fazer o que deve ser feito, a pergunta deveria ser: “Se não aqui, então onde? Se não agora, quando? Se não eu, quem?
Publicado na Revista Família Cristã, nr. 917, maio de 2012, p. 27.
Leonardo Goldberg – Psicólogo e cronista. E-mail:leoaegoldberg@gmail.com
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