Cuidando dos cuidadores

Quem tem um familiar com Alzheimer precisa cuidar da própria mente

Paul Divinagracia não é nenhum santo. Contudo, quem o vê cuidando da mulher, Virgie, que sofre de Alzheimer há 11 anos, pode ter a impressão contrária. O casal  comemorou 50 anos de casamento em agosto passado. Aos 75 anos, Paul ainda chama a mulher, de 87, de  “meu bem”, e não há dúvidas de que esteja sendo sincero, mesmo depois de responder a mesma pergunta 10 vezes em poucos minutos.

A paciência, ele afirmou em entrevista, é a palavra de ordem para sua existência.

– Continuar de bom humor me ajuda a continuar equilibrado – afirmou.

Ninguém duvida que ser um cuidador em tempo integral para um familiar com Alzheimer ou qualquer outro tipo de demência exija ajustes constantes.

Paul poderia facilmente ser uma das pessoas retratadas nas 54 histórias do novo livro Support for Alzheimer’s and Dementia Caregivers: The Unsung Heroes (Apoio aos cuidadores de Pacientes com Alzheimer e Demência: os Heróis Desconhecidos, em tradução livre), de Judith L. London. A autora, que atua como psicóloga em San Jose, na Califórnia, nos Estados Unidos, baseou cada uma das histórias em situações enfrentadas por cuidadores que ela conheceu.

Os desafios incluem convencer os pacientes e outros parentes que a doença realmente existe, que os lapsos não são apenas o resultado do declínio gradual na memória que costuma acompanhar o envelhecimento e que é preciso cuidar para que pessoas com algum tipo de demência não saiam de casa despercebidas e se percam (fechaduras duplas nas portas são uma maneira eficaz de impedir que isso ocorra).

Judith se preocupa muito com o estresse enfrentado pelos cuidadores, e ela tem bons motivos. De acordo com dados da Universidade de Stanford e da Associação do Alzheimer, mais de 15 milhões de pessoas fornecem cuidados gratuitos a parentes ou amigos com doença de Alzheimer e outras formas de demência. Diversos estudos mostram que o estresse da tarefa pode aumentar o risco de uma série de doenças e até mesmo de morte.

Paul ama viajar e descobriu que pequenas viagens estimulam sua mulher de uma forma positiva. Em uma recente viagem de Fremont, na Califórnia, onde eles vivem, até Seattle para um evento familiar, eles passaram pelas belas montanhas do norte de São Francisco.

– Ela adorou a viagem e se lembrou dela, muito embora ela não consiga se lembrar do que eu disse há dois minutos – contou.

 

Vítimas escondidas

Um dos desafios mais comuns e difíceis enfrentados pelos cuidadores ocorre quando os pacientes com demência se tornam agitados, fisicamente ou verbalmente agressivos, situações que são emocionalmente exaustivas e muitas vezes perigosas para pacientes e cuidadores.

Laura N. Gitlin, professora da Faculdade Enfermagem Johns Hopkins, trabalha com uma equipe de terapeutas ocupacionais que procuram formas de lidar com a situação sem recorrer ao uso de medicamentos. Eles prescrevem atividades que os pacientes e os cuidadores podem fazer juntos, de acordo com as capacidades, necessidades e interesses do doente. O resultado é que ficam mais calmos, seguros e engajados, e os cuidadores, menos estressados.

Ainda assim, há momentos em que até o cuidador mais astuto e esperto não é capaz de superar um desafio, especialmente quando o paciente com Alzheimer se torna violento.

Quando o marido de uma mulher parecia possuído  por demônios, gritando ofensas e a ameaçando com uma faca, escreveu Judith, ela finalmente percebeu que não seria mais capaz de cuidar dele com segurança em casa. Relutantemente, ela teve de colocá-lo em casa de repouso, para que ambos ficassem seguros.

É fundamental que os cuidadores também cuidem de si mesmos, acrescentou, fazendo exercícios físicos, comendo e dormindo bem, e recebendo o cuidado de que necessitam.

Jane E. Brody, publicado nos Jornais The New York Times e no Diário Catarinense, 08/03/2014, – Vida e Vaúde, p. 7

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