Coordenador do Programa de Transtornos de Ansiedade na Infância e Adolescência do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP, Fernando Ramos Asbahr compara a percepção do ansioso a um sensor desregulado de incêndio, que alaga um prédio inteiro por conta de um riscar de fósforo. “A ansiedade pode até atrapalhar o desenvolvimento, mas o problema é quando altera o dia a dia. A criança não consegue ir para a escola, não entra numa loja, tem problemas de convivência”, afirma.
Os sintomas, que acometem principalmente crianças na faixa dos 6 a 8 anos, caracterizam-se por preocupações excessivas quanto aos perigos que envolvem os pais ou a si próprio, relutância em estar desacompanhado deles e a dificuldade em adormecer ou dormir fora.
Algumas crianças sentem mais ansiedade do que outras. Cerca de 15-20% das crianças nascem com um temperamento mais ansioso (a parte da amígdala de seus cérebros é mais reativa a novos estímulos desde o início). Uma criança ansiosa pode gritar, tremer, fugir, ficar especialmente quieta, agir como boba, se esconder, se agarrar, ter acessos de raiva ou agir agressivamente para evitar um ambiente ou evento que a deixe desconfortável.
Quando as crianças estão ansiosas, muitas vezes experimentam uma resposta de luta, fuga ou congelamento (estresse agudo), que é uma reação fisiológica em resposta a algo que consideram assustador. O sistema nervoso simpático do corpo é ativado, desencadeando a liberação de adrenalina e noradrenalina, o que aumenta a frequência cardíaca, a pressão arterial e a frequência respiratória. Depois que a ameaça passa, leva de 20 a 60 minutos para que o corpo volte aos níveis normais.
Dizer à criança ansiosa para “se acalmar” ou “se enturmar” não funciona
Às vezes os pais cometem o erro de tentar argumentar com os filhos ou dissuadi-los de seus medos (sem primeiro abordar os fatores fisiológicos agudos em jogo). Eles podem dizer coisas como “acalme-se”, “pare de chorar” ou “você precisa ser corajoso”. Como a ansiedade da criança pode parecer dramaticidade (por exemplo, sair correndo da sala), alguns pais chegam a puni-la com o chamado ‘cantinho da disciplina’ ou até palmadas. No entanto, pesquisas sobre o cérebro sugerem que é extremamente difícil (se não impossível) para uma criança pensar com lógica ou controlar seu comportamento ansioso, até o momento em que ela saia do modo de luta / fuga / congelamento.
Com base na ciência, aqui estão 10 maneiras pelas quais os pais podem ajudar gentilmente os filhos a se acalmarem, a recuperarem a sensação de segurança e controlarem a ansiedade.
1. Estimule o nervo vago
O nervo vago é o mais longo e complexo do corpo. Ele conecta o cérebro a muitos órgãos importantes em todo o organismo, incluindo o intestino, o estômago, o coração e os pulmões. O nervo vago também é uma parte fundamental do sistema nervoso parassimpático e influencia a respiração, a função digestiva e a frequência cardíaca, além de ter influência sobre a saúde mental. Por essa razão, a otimização da função do nervo vago pode melhorar a saúde da criança, fortalecendo as defesas diante do estresse.
As maneiras de estimular o nervo vago incluem: Massagem com as mãos, mascar chiclete; Cantar ou cantarolar; Respirar lentamente; Comer um pedaço de chocolate amargo (que também é um regulador parassimpático), Gargarejar (sem água).
2. Ensine a criança a respirar profundamente, respirando com ela
Quando a criança está ansiosa, ela tende a respirar rápido e superficialmente, vindo diretamente do peito. Respirar mais lenta e profundamente (do abdômen ou do diafragma) pode relaxá-la. Respire com ela fazendo o seguinte: encha balões, sopre bolhas de são, sopre cata-vento, ensine-a assobiar, cheire uma rosa e depois sopre-a.
3. Cruzar braços e pernas para o lado inverso
Cruzar a linha média ou mover as mãos, pés e olhos para o outro lado do corpo pode ajudar a reconfigurar o cérebro. Estudos sugerem que quando você move os braços ou as pernas pelo centro do corpo, os hemisférios cerebrais são ativados e trabalham juntos para que você possa pensar com lógica e emoção. Tente repetir com o seu filhos os movimentos das imagens acima. Façam moinhos de vento com os braços, movendo os braços em um círculo para dentro e não para fora. Faça de conta que está encerando o chão com as mãos, para dentro e para fora. Desenhe um grande número oito na calçada e peça a criança para percorrê-lo.
4. Inclua atividades de esforço físico de acordo com a idade na rotina
Atividades físicas de ‘esforço’ fornecem informações para os músculos e articulações, aumentam o foco e a atenção, e ajudam a criança concentrar. Algumas são: carregar a mochila ou ajudar a guardar as compras, limpar os brinquedos, escalar um trepa-trepa, carregar livros ou puxar um carrinho, pode ajudar a criança a acalmar e controlar suas emoções.
5. Ensine a criança a verbalizar os sentimentos
O Dr. Daniel Siegel afirma que quando a criança está no modo de luta ou fuga, suas emoções aumentam e ela não consegue compreendê-las mentalmente, por isso é muito importante ensiná-la a verbalizar o que está acontecendo com ela, como ela se sente, da forma como se sente. Ao falar, a crianças usará o lado esquerdo do cérebro para dar sentido à sua experiência e com isso aprende a autorregulação das emoções. Muitas vezes, observa Siegel, a criança, antes de verbalizar, fará uma comunicação com o próprio corpo e aos poucos vai dando voz ao que tenta demonstrar por meio de gestos. Estimule a criança a dar voz ao que o corpo está tentando dizer.
6. Conduza a criança à mentalização do seu lugar feliz
Mostre um desenho de um lugar: uma cidade, uma floresta, um parque, uma brinquedoteca… e comece a fazer perguntas sobre ele: Imagine você nesse lugar confortável e feliz. O que você vê lá? O que você ouve? O que você cheira? Como está o seu corpo? – Então, quando ela estiver ansiosa, faça-a se lembrar do seu lugar feliz.
As crianças também podem estreitar seu foco colorindo ou brincando com o pote da calma, que é um potinho de plástico transparente cheio de purpurina.
7. Crie uma plano de ação para prevenir a ansiedade
Fazer um plano (MAP) ou Meu Plano de Ansiedade (MAP) pode ajudar seu filho a aprender a tolerar em vez de eliminar a ansiedade. Por exemplo: se a criança tem medo da tempestade, ela pode ter uma atividade artística que só execute quando tem tempestades: pode ser uma pintura, montar um quebra-cabeça, fazer um castelo de cartas ou montar lego.
8. Use o bom humor para estimular a criança a sair da crise
Pesquisas sugerem que a exposição ao bom humor pode reduzir significativamente a ansiedade. O bom humor pode distrair, relaxar os músculos, reestruturar, curar e liberar endorfinas que combatem o estresse. Experimente jogar um jogo bobo com seu filho, assistir desenhos animados pastelão juntos, ler um livro engraçado juntos ou contar piadas adequadas à idade da criança.
9. Aposte na rotina da alimentação e do sono
Estabelecer horários pragmáticos para fazer as refeições e para dor é indispensável para à saúde integral da criança. É possível que as crianças que têm um sono ruim tenham níveis mais elevados de cortisol, que é o hormônio do estresse. A principal dica para ajudar a criança a dormir melhor é estabelecer uma rotina. Uma pesquisa da Universidade de Saint Joseph, nos Estados Unidos, acompanhou 405 famílias com filhos de 7 meses a 3 anos. E os resultados mostraram que o simples fato de a criança ir para a cama no mesmo horário todas as noites melhora a continuidade do sono noturno e, como consequência, contribui para o bom humor.
Mas, é bom lembrar que essa regularidade só se torna possível a partir do quinto mês de vida, que é quando o bebê passa a produzir a melatonina – o hormônio que induz à sonolência – dando sinais para o organismo de que é o momento de dormir. Portanto, quando seu filho completar cinco meses, comece a estabelecer um ritual de sono, que deve ser repetido diariamente, especialmente quando entram em fase escolar.
10. Reflita sobre o próprio comportamento ansioso diante das crianças
Tanto por características do ambiente em que são criados quanto pela herança biológica, a ansiedade dos pais tem influência crucial na saúde dos filhos. “O maior fator de risco de uma criança ou adolescente é ter um pai ou mãe ansioso”, diz Asbahr. Há casos em que os pais sentem-se fragilizados frente à prole, e acabam não segurando a barra de ser um ponto de referência e segurança. É também por isso que o envolvimento dos pais na terapia é fundamental para o sucesso do tratamento.
“O pai ou mãe ansioso, que acha que o filho vai sofrer na escola, deixa o filho ansioso”, diz Asbahr. Por outro lado, ele afirma que, em certos casos, a ansiedade auxilia no diagnóstico. “Pais que sofreram na infância pensam ‘eu sei o que ele está sentindo, eu tinha isso’. Se a pessoa teve prejuízo pela ansiedade, vai sentir empatia, e isso é bom”.
Publicado no site: www.portalraizes.com
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