Folheando jornais, assistindo a notícias, não é difícil perceber que relacionamento conjugal é tema constante na mídia impressa e televisiva. Segundo dados do IBGE[1], em 2011 a taxa de divórcios no Brasil aumentou 45,6% em um ano. Uma pesquisa profunda poderia averiguar as diversas causas da origem desse elevado número de divórcios.
Aqui, quero buscar reflexão naquela que entendo como uma das mais fortes causas de separação de casais ou de crises conjugais, qual seja, a falta de um “Projeto” em comum. E para que seja entendido o que efetivamente quero dizer com “Projeto”, vejamos alguns dos seus significados[2]. Projeto: “plano para a realização de um ato” (…). Do latim projectum “algo lançado a frente”. Na filosofia existencial “projeto é aquilo para que tende o homem e é constitutivo do verdadeiro eu”. Três significados para a palavra projeto que unidos em si traduzem o conceito que defendo – Casamento é um projeto no qual é preciso um plano para algo a ser vivido à frente por um eu verdadeiro. E diante desse conceito pergunto: quantos noivos estão conversando sobre o seu projeto “casamento”? Será que percebem que o “algo a ser vivido à frente”, que estão prestes a consumar quando dizem o SIM, é a família? Será que demonstram o seu “eu” verdadeiro para o parceiro antes do casamento?
Não são poucas as vezes que ouvimos reclamações de cônjuges que se dizem surpresos em como seu parceiro mudou de atitudes e ou de comportamentos após o casamento. Muitas vezes, na fase de namoro, um dos parceiros percebe que seu companheiro lida com determinada situação de forma muito diferente com a qual ele próprio lidaria. Não vê nessa oportunidade um momento de conversar e expor sua opinião sobre o assunto. Deixa a situação passar, imaginando que após o casamento, estando juntos, as coisas mudam, ou, que após casados irá conseguir mudar a opinião de seu parceiro. O que na maioria das vezes não ocorre. As pessoas não mudam porque casam.
Desta feita, o Projeto casamento, que culmina com a Família, precisa ser pensando e conversado abertamente pelo casal. Além de toda parte conjectural que vem com cada parceiro, é preciso que ambos alinhem toda essa informação que já constitui o eu de cada parceiro de modo a concordarem em como esse Projeto vai se desenvolver nos anos à frente. E um dos alinhamentos que considero o mais importante é escolherem juntos em que bases irão educar os filhos da relação. Influências familiares pregressas, popularmente conhecidas como “forma de criação” interferem de maneira significativa nesse momento e no relacionamento conjugal. Entendo e minha experiência me assegura que seremos pais, em parte, baseado naquilo que aprendemos como filhos.
Assisti a uma entrevista[3] com um atleta americano casado com uma famosa modelo brasileira, quando questionado pelo entrevistador acerca das dificuldades culturais entre ele e sua esposa brasileira com relação ao casamento, a resposta do atleta foi pontual. Disse que apesar de morarem em países diferentes e de culturas diferentes, a forma como foram criados pela sua família era muito similar e isso facilitava e fazia funcionar o casamento e a educação dos filhos. E é exatamente o que quero pontuar aqui.
O Projeto Família precisa ter base parecidas, ou, pelo menos que se agreguem, ou ainda, que sejam possíveis de serem compactuadas. Julgo que existirão dificuldades num casamento quando um dos cônjuges vê valores numa determinada religião e o outro não quer saber de religiosidade. Julgo que existirão dificuldades num casamento quando um dos cônjuges tem dificuldades de lidar com dinheiro, tanto para economizar quanto para gastar, quando o outro tem controle sobre esse mesmo impulso. Ainda, quando um dos cônjuges quer um parceiro para colocar uma mochila nas costas e desbravar o mundo e o outro quer uma casa fixa com filhos e cachorro. Entendo necessário que cônjuges conheçam hábitos e necessidades um do outro. Partindo desse conhecimento devem buscar uma forma conjunta de viver o Projeto Família respeitando a personalidade de cada, sem que sonhos e desejos individuais precisem ser deixados de lado. Sem que haja frustrações não conversadas, sem que haja mágoas não resolvidas.
Nessa esteira de pensamento, entendo que a chegada dos filhos, quando o Projeto não é bem solidificado, bem conhecido, pode acabar tumultuando ainda mais a vida conjugal. Mas, não é a chegada deles pura e simplesmente que causa a dificuldade no relacionamento entre o casal, e sim as deficiências do Projeto Família, o qual não foi bem estruturado e conhecido entre os cônjuges. Uma família feliz não se improvisa.
Naiara Vicentini – Psicóloga e Advogada.
[1]http://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo?view=noticia&id=1&idnoticia=2294&busca=1&t=registro-civil-2011-taxa-divorcios-cresce-45-6-um-ano
[3]Atleta americano Tom Brady, casado com a modelo brasileira Gisele Bündchen, em entrevista a Luciano Huck dia 18.04.2015
Artigo publicado na Revista Escola de Pais do Brasil – Seccional da Grande Florianópolis nº 6, junho de 2015, p. 16.
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