“A relativa abdicação educativa de muitos adultos nas famílias atuais é uma verdadeira tragédia. Eximir-se desta responsabilidade sob pretexto de respeitar a liberdade dos filhos significa ignorar que estamos constantemente submetidos à influência exterior e que os jovens encontram se à mercê de mensagens socialmente dominantes se não tiverem o acompanhamento de adultos que ajudem as novas gerações a terem espírito crítico” Pedro José Gómez Serrano
Aí estão esses jovens. De todo tipo. Vemo-los nos pátios das escolas e das universidades. Fazem-se presentes nos grandes espetáculos e eventos em praças públicas e nos estádios de futebol. Gostam das baladas ou preferem esportes mais exigentes. Alguns sabem para onde caminhar. Brilham nos concursos e avaliações. Há seguramente aqueles que galhardamente vencem na vida. Pode ser, porém, que estejam sendo treinados para aderirem ao mercado e serem agentes capacitados da sociedade de consumo. A impressão que se tem é que são orientandos em vista de um horizonte que não escolheram e que lhes está sendo imposto. Tema delicado e complexo esse da juventude. O que vivem, o que pensam esses rapazes e moças entre 16/18 e 29/30 anos? Que futuro os adultos e as sociedades estão a lhes sugerir ou mesmo preparando? O que lhes está sendo efetivamente oferecido?
Em nossos dias, jovem, juventude são termos empregados nem sempre com o necessário rigor. A maneira tão vaga ou dilatada como se emprega o termo preocupa. Dizemos, por exemplo, que alguém que morre com setenta anos, morreu jovem. Os adultos querem conservar sua juventude e o fazem de múltiplos modos entre os quais recusando acolher a idade que vivem. Roubaram a juventude dos jovens. Não querem envelhecer. Persistem em serem os donos do tempo. Perdidos no meio da liquefação da sociedade, os adultos não ousam, com convicção, transmitir algo em que, na verdade não acreditam. Os adultos experimentam grande dificuldade em sair da cena. Ou são pessoas extremamente desajeitadas em educar as novas gerações.
Sabemos (e como!!!) que tudo está em devir. Há transformações irreversíveis. Importante, no entanto, que ousemos elencar, quem sabe idealmente, aquilo que marca o tempo da juventude e que precisa ser vivenciado por eles, para que possam habitar belamente no mundo que está sendo gestado e que poderão ajudar a gestar com o melhor de suas entranhas. O que agora vamos elencar é uma situação ideal. Fixamo-nos nesta faixa de idade que vai dos 16/17 aos 29/30 anos. Jovem, segundo a etimologia do latim, vem de iuv, iuvare que quer dizer ser útil, contribuir para o bem comum.
Estamos bem conscientes da importância dessa faixa etária. Vejamos algumas de suas características:
- Estamos no tempo do estudo. Há o ensino fundamental e médio, os percursos universitários e os cursos técnicos. Momento importante de formação da mente dos jovens. Mente, Inteligência, mas tudo salpicado de uma simpatia pelo humano. Escolas que não apenas preparem para o mercado, mas tenham o cuidado de formar pessoas com senso crítico. Momento em que, de modo especial por meio da filosofia e da história, os jovens se assenhorem das conquistas humanas, Neste momento da história será preciso deixar de lado ideologias e inclinar-se para o humano. Os jovens ajudam o país a ser mais humano e mais verdadeiro percebam erros e desvios e tentem abrir as portas para um mundo mais humano. Neste momento da história será preciso deixar de lado ideologias e inclinar-se para o humano. Os jovens ajudam o país a ser mais humano e mais verdadeiro.
- Tempo de fortalecimento do físico, da beleza e da solidez dos músculos, de cuidados para que nada venha a prejudicar gravemente o amanhã de seus corpos. Mens sana in corpore sano. Tempo de descoberta da própria corporeidade sem idolatria. O homem é bem mais do que a graça de seu andar e musculatura de seus corpos.
- Tempo da descoberta da sexualidade, não apenas da genitalidade, da biologia do sexo, ou da maneira de fazer sexo requintado, mas de uma atenção voltada para esse dinamismo veemente e violento que precisa ser orientado na linha do dom, do respeitoso aproximar-se do corpo do outro, de uma tomada de consciência que ele e ela podem ser administradores do movimento da criação, da criação de seres humanos que serão fruto de um bem-querer profundo e não simplesmente de uma aventura sexual mais ou menos fugaz e sem marcas do humano.
- Tempo de criar convicções, de abraçar valores que podem nortear a vida pessoal de cada um e que, somados e harmonizados com convicções e valores vividos por outros podem tornar a aventura humana do planeta mais prazenteira e mais humana. Fundamental uma educação que crie convicções nesse período da juventude. Leituras, fóruns de debate, encontro com adultos que estão de bem com a vida e se tornaram pessoas que enfeitam a terra na linha do dom, da generosidade, do esquecimento de seus pequenos e tacanhos interesses. Convicção de que precisamos juntos cuidar da sobrevivência do planeta e de uma qualidade de vida humana dos seres que o habitam. Nada de viver por viver
- Juventude, tempo das escolhas. A vida toda é tempo de escolha. Nesse mundo de rápidas mudanças e transformações radicais não podemos mais acreditar que tudo possa ser decidido uma vez por todas. Importante, no entanto, na precariedade e instabilidade de tudo, lutar por arrumar o interior na linha daquilo que se escolheu e lutar, sem teimosia doentia, para perseguir uma meta, realizar um projeto de vida. Ao escrever estas linhas estou como que mastigando as palavras. E, no entanto, na faixa etária da juventude optamos por um certo jeito de viver, o cuidado de não escolhermos caminhos de facilidade que vão nos deteriorar (fugas, drogas, etc.). É tempo de escolher uma profissão que possa nos realizar e ser útil para o mundo. Não ignoro o fantasma do desemprego. Diga-se de passagem, que é imoral uma sociedade que não oferece trabalho para seus cidadãos. Tempo de escolha da pessoa com quem quererá viver a ventura do amor conjugal e familiar. Tempo de tomada de decisões que sejam consentâneas com nossa dignidade pessoal.
- Tempo de perscrutar as profundezas de cada um e o Mistério para além das estrelas. Nosso coração não se satisfaz apenas com coisas bem-sucedidas no dia a dia. Não se satisfaz com um certo conforto. Há uma inquietude beata que não pode ser sufocada com a imperícia do viver. Irrequieto é nosso coração enquanto não descansar em Deus, no Mistério.
“A renúncia dos pais (e adultos) em levar a sério suas obrigações educativas parece refletir tanto a perplexidade dos próprios adultos ante o pluralismo reinante, como um certo medo de confrontação ou de serem tidos como tradicionais e repressivos. Ora, a ausência de educação é mais perniciosa do que uma educação autoritária (da qual alguém pode libertar-se com o tempo). De fato, o abandono de relacionamento e afeto em que vivem muitos jovens torna-se algo nefasto para a consolidação de sua personalidade, fonte de tantos fracassos escolares e de comportamentos socialmente conflitivos” (Pedro Gómez Serrano, La familia, escuela de liberación, justicia y solidariedade, Sal Terrae 91 (2003), p. 377).
Ser uma mostra de que os próprios adultos frente ao pluralismo ambiental, com receio da confrontação ou receio de serem tradicionais e antiquados e repressivos.
Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM, frade franciscano, residente em Petrópolis (RJ), nascido a 6 de novembro de 1938, membro do Conselho de Educadores da Escola de Pais, é formado em catequese e teologia pelo Instituto Católico de Paris, faz crônicas sobre a família para a Rádio Nove de Julho e tem publicações na linha da espiritualidade e do franciscanismo, se ocupou durante anos da Pastoral Familiar da CNBB. Contato: freialmir@gmail.com
Publicado na Revista Escola de Pais do Brasil – 56º Congresso Nacional – 2019, p. 40-42.
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