Um terapeuta familiar norte-americano criou uma tipologia para distinguir os diferentes estilos de viver a paternidade. Saiba se é um pai equilibrado, negligente, austero, permissivo, autoritário…
Pais e filhos perfeitos são coisas de filme. Não existem na vida real. É deste pressuposto que parte o terapeuta familiar e infantil Ronald Huxley para analisar os diversos tipos de relação que os progenitores criam com as crianças. Há os meigos, os austeros, os desleixados, os autoritários. Alguns conseguem o equilíbrio. Mas uma coisa é certa: o comportamento dos adultos tem sempre uma influência direta na maneira de estar das crianças. E a solução não passa apenas pelos afetos. Também os limites são muito importantes na vida dos mais pequenos. O que é preciso é saber impô-los.
No livro “Love & Limits: Achieving a Balance in Parenting”, Ronald Huxley explica que conseguir um equilíbrio entre o amor e a disciplina é um desafio sério no qual vale a pena investir. Até porque «os papéis, as relações e as responsabilidades de ontem já não se aplicam aos pais de hoje». O especialista defende que os progenitores devem esforçar-se por avaliar a sua maneira de interagir e estar dispostos a corrigir os pontos fracos.
Cada estilo, define Huxley, corresponde à «forma que os pais encontram para expressar as suas opiniões sobre como ser um bom pai». Essas crenças influenciam em muito o papel que desempenham e dependem de muitos fatores: desde a predisposição da pessoa ao histórico de relacionamentos em que participaram. Para ajudar na tarefa de autoavaliação, Huxley identifica quatro formas de viver a paternidade: equilibrada, permissiva, autoritária e negligente ou austera. E compara cada uma delas com personagens de séries televisivas de sucesso. Descubra com qual delas se identifica mais.
Os Equilibrados
Características: Estas são famílias que baseiam as suas relações em conceitos democráticos. Acreditam na igualdade e na confiança entre pais e filhos. Isto não significa que os progenitores se demitam da sua função de comandar o barco. A eles cabe a última palavra em todas as decisões que envolvam a família. Têm poder de veto. E são eles que definem as regras, ainda que estejam abertos a negociar exceções ao estabelecido. O amor é, para este tipo de pais, tão importante como os limites e a disciplina. Sabem que têm a missão de ajudar os miúdos a crescer, desde a fase em que são dependentes até ao momento em que caminham pelos seus próprios pés. Neste processo, preocupam-se em fazer ver aos filhos que as suas ações têm consequências, que devem ser responsáveis pelas suas escolhas e que há fronteiras que não podem ultrapassar. A melhor maneira de passar os valores essenciais aos miúdos é, acreditam, falar sobre isso e dar o exemplo. Disciplina não significa castigo e serve para ensinar e guiar, não para castigar, manipular ou controlar. É inaceitável atribuir culpas ou envergonhar a criança pelo que fez errado. Encaram algumas frustrações como parte do crescimento e estão dispostos a encorajar os filhos a aceitar novos desafios. Faz parte do método ensiná-los a resolver os problemas. Empenhados na tarefa de encontrar um equilíbrio entre o amor e os limites, estes pais são constantemente confrontados com situações em que têm de se questionar sobre as próprias crenças para melhor darem a mão aos filhos.
Prós: União é a palavra de ordem nestas famílias. As crianças crescem e tornam-se adultos com bons níveis de autoestima, resultados escolares acima da média e uma noção correta de como devem ser as relações humanas. São responsáveis, sabem negociar e respeitar os outros.
Contras: É difícil enumerar algum ponto negativo neste estilo. O maior problema é conseguir incluir-se neste grupo. Nem sempre é assim tão fácil…
Personagem-tipo: Elyse e Steven Keaton
A militância hippie dos anos 60 deixou de herança aos pais da série «Quem Sai aos Seus» a capacidade de ouvir os filhos e de levar a sério as suas opiniões, mesmo que estas sejam muito diferentes das deles. Quem diria que, com estes ideais, iriam ter um filho como Alex (Michael J. Fox), um Republicano conservador, ou uma filha como a consumista e desinformada Mallory. Os Keaton podiam até aceitar os comportamentos irreverentes de Jennifer e Andrew, os mais novos. Mas todos eles sabiam que havia um limite que não podia ser ultrapassado. Os pais tinham sempre o cuidado de explicar porque estavam zangados e de indicar o que teriam esperado dos filhos. Só depois determinavam, sem hesitações, a punição pela ousadia de quebrar as regras.
Os Permissivos
Características: Aqui, o afeto é grande, mas os limites nem sempre estão presentes. Os pais dão atenção e mimo de sobra aos filhos. Recorrem sempre a argumentos racionais para convencerem as crianças a comportar-se como eles querem. Consultam-nas quanto ao que querem fazer e às regras que é importante cumprir. São negociadores por natureza. Conseguem criar laços fortes com os miúdos, respeitá-los e disciplinar sem recorrer à punição. Mas, muitas vezes, têm sérias dificuldades em estabelecer os limites ou as normas básicas. Perdem, não raramente, um tempo infinito a chegar a um acordo sobre situações triviais. E tendem a ser demasiado brandos no que toca a explicar quais as consequências de desobedecer, quando elas existem. Acreditam que as crianças são capazes de regular os próprios impulsos e que esses objetivos infantis não devem ser frustrados ou desvalorizados. Podem perder o controlo da situação.
Prós: A criança sente-se acarinhada e torna-se amiga dos pais. Tem consciência de que a sua opinião é importante lá em casa.
Contras: Corre-se o risco de não se conseguir estabelecer as regras mínimas de convivência. Como sabem que não vão ser castigados, estes miúdos podem tornar-se insubordinados, egoístas e muito exigentes. As relações de amizade são, por vezes, turbulentas ou mesmo impossíveis.
Personagens-tipo: Morticia e Gomez Addams.
Os pais da Família Addams são daqueles que fazem todas as vontades aos meninos, sejam lá quais forem os caprichos em causa. Se as crianças querem, então por que não satisfazer-lhes os desejos? Dinheiro não é problema na mansão negra. E a noção de regras é tudo menos ‘normal’. No episódio em que o diretor da escola obriga a família a mandar os filhos para a escola, há um claro exemplo de como, para os Addams, a opinião dos descendentes é lei. A filha Wednesday regressa da escola muito assustada com a quantidade de ogres, bruxas e feiticeiros que morrem nos contos dos Irmãos Grimm. Tanto o pai como a mãe têm a mesma reação: chocados com os traumas que as histórias podem trazer à menina, proíbem-na de ir à escola. E avisam o diretor do estabelecimento de ensino que os miúdos não voltam às aulas enquanto o livro não for banido do programa.
Os Negligentes e Austeros
Características: Falha o calor humano, mas também os limites. Os pais não se preocupam muito com o bem-estar físico dos seus filhos e estão poucas vezes disponíveis para acompanhar as necessidades de atenção e aprendizagem. Podem também ser demasiado críticos e estar permanentemente a condenar o que os miúdos fazem. Mas, na maioria das vezes, terão uma atitude de indiferença. Com facilidade deixam os filhos mais pequenos entregues ao cuidado de outras crianças e tendem a exigir aos miúdos uma maturidade superior à que a sua idade pressupõe. A responsabilidade não é ensinada aos filhos de uma forma pedagógica e cuidada. É antes aprendida por eles, na prática, por necessidade e ausência dos cuidados dos pais. Estes meninos nem sempre são levados ao médico quando estão doentes e aparecem frequentemente com roupas inadequadas ao seu tamanho ou à época do ano em questão. Os pais empenham-se pouco em manter uma relação calorosa com os filhos. Não os apoiam. Escasseia a paciência em relação a problemas disciplinares. A sua inabilidade não resulta de maus instintos, na maioria dos casos, mas apenas da repetição do modelo que os pais usaram quando eles próprios eram crianças.
Prós: A verdade é que não há pontos favoráveis neste tipo de relação.
Contras: Com tão pouca atenção dos pais, as crianças estão mais sujeitas a magoar-se ou a meter-se em sarilhos. A presença dos progenitores chega a confundir ou humilhar os miúdos. A falta de afeto cria-lhes dificuldades no estabelecimento de relacionamentos com outras pessoas. Os meninos sentem-se rejeitados e podem adotar comportamentos hostis sem perceber porquê. A saúde é um ponto fraco nestas crianças.
Personagens-tipo: Marge e Homer Simpson
Em casa d’Os Simpsons, a atitude negligente dos pais (sobretudo do pai) alterna com uma total intransigência em relação ao comportamento das crianças. E o charme da família, o humor da série baseia-se nesse registo quase esquizofrénico de paternidade. Homer tanto se esquece que tem filhos, como lhes grita ordens ou até lhes diz que a paternidade é difícil, mas não a trocaria por nada deste mundo – a não ser por um conjunto de jantes novas. Nesta casa, Maggie, o bebé, deambula pelo chão de disparate em disparate sem que ninguém lhe preste atenção. Bart é um delinquente em potência – coleciona aventuras perigosas e castigos duros atribuídos por um pai sem paciência para lhe dar atenção. Lisa, a irmã do meio, inteligente e talentosa, não esconde o desconforto quanto às rotinas familiares. Entristece-se quando o pai se esquece do aniversário dela e a tenta subornar, desilude-se com a indiferença de Homer e refugia-se no seu saxofone. Marge, a mãe, é um elemento impotente, a quem parece que o azar bate sempre à porta. É incapaz de equilibrar a casa sozinha.
Os Autoritários
Características: O que importa são as regras. A demonstração dos afetos é um fator secundário na educação. Isto não quer dizer que estes pais não gostem dos filhos. Para eles, obedecer é uma virtude. E, por isso, não esperam que os filhos desafiem as regras de conduta que os progenitores estabeleceram. Não hesitam em recorrer a castigos sempre que a norma é posta em causa, até porque a opinião que eles têm sobre o que é certo e o que é errado é soberana. Reações agressivas ou apenas negativas à disciplina imposta serão mal recebidas pelos pais. A rebeldia vale a respetiva punição. De um modo geral, as sociedades ocidentais tendem a criticar este estilo de paternidade, identificando-o com o comportamento adotado por muitos pais que abusam dos filhos, seja sexualmente, ou por agressões físicas ou emocionais.
Prós: Nem tudo é mau neste estilo. As crianças sabem o que hão-de esperar dos pais e, apesar da ‘rédea-curta’, as regras podem ajudá-las a sentir-se seguras e estáveis. Respeitam as normas e sabem quais as consequências de não o fazer.
Contras: Os miúdos obedecem cegamente, mas não aprendem a pensar sobre o que lhes é imposto. Podem ter dificuldade em saber distinguir, por eles mesmos, entre o certo e o errado. O medo faz parte da vida das crianças desde cedo. Aquelas que se revoltam com tanta regra não desobedecerão em frente aos pais por receio, mas vão querer quebrar as amarras fora de casa.
Personagens-tipo: Claire e Cliff Huxtable
Encontrar uma série de televisão em que o pai e a mãe sejam ambos verdadeiramente autoritários é uma tarefa quase impossível. Produtores e argumentistas têm optado, quase sempre, por fórmulas mais brandas e equilibradas, aparecendo este tipo de comportamento em cenas esporádicas incluídas nos episódios. Assim, Ronald Huxley escolhe os dias piores dos pais de «The Cosby Show» para ilustrar as tendências demasiado rígidas dos progenitores. É um facto que Cliff e Claire Huxtable são pais afetuosos e dedicados aos filhos. Mas também é inegável que, quando se trata de castigar, não são propriamente meigos. Cliff, obstetra de profissão, chega a dizer ao filho: «Eu trouxe-te a este mundo. Também consigo ver-te fora dele!» E Claire não hesita em ser rígida e mostrar à filha Rudy quem manda, depois de ela tentar desobedecer-lhe: «Vai mudar esse vestido. E nunca tentes desafiar-me outra vez!»
TESTE O SEU COMPORTAMENTO
A autoavaliação é a chave para resolver os aspetos menos bons da relação que tem com os seus filhos. Responda às perguntas e descubra qual o grupo em que mais se enquadra.
Equilibrados
– Depois de deixar o seu filho expressar a opinião dele, costuma anunciar-lhe a decisão final?
– Sente que é importante falar com eles sobre responsabilidade e até sobre a própria vida?
– Tem por hábito decidir que assuntos estão abertos a negociações e quais não estão?
– É importante para si ajudar o seu filho a moldar o comportamento de acordo com aquilo que espera dele?
Permissivos
– O seu filho recusa-se a obedecer às suas instruções?
– A vossa relação passa sempre por negociações e cedências da sua parte?
– Implora-lhes que colaborem consigo?
– Sente que eles aprenderam a dar-lhe a volta e a aproveitar-se de si?
– Tem o costume de usar roupa igual à do seu filho para lhe satisfazer um capricho?
Negligentes ou Austeros
– Costuma deixar o seu filho arranjar-se sozinho ou autorizar outros familiares a vesti-lo ou dar-lhe de comer sem que esteja por perto?
– Recorda-se de alguma vez não ter tratado uma otite, uma dor de dentes ou qualquer outra doença da sua criança?
– Tem por hábito ameaçar, gritar ou bater no seu filho para o obrigar a cooperar consigo?
– Alguma vez deixou o seu menino, ainda pequeno, sozinho em casa durante várias horas seguidas?
– Dá consigo a pensar que seria muito melhor que o seu filho visse mais televisão, filmes ou passasse mais tempo de volta dos videojogos?
Autoritários
– Acredita que não há qualquer diferença entre disciplina e castigo?
– O respeito que o seu filho tem por si é a coisa que mais valoriza enquanto pai?
– Costuma dar ordens à criança recorrendo à frase «Porque eu mandei»?
– Gosta que a sua criança seja vista, mas que não se oiça, de preferência?
– Em ocasião alguma bateu no seu filho com objetos, como um cinto, por exemplo?
Publicado no site: http://www.paisefilhos.pt/index.php/familia/pais-a-maes/7328-que-tipo-de-pai-e-voce?showall=1
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