Com a puberdade, dá-se o grande salto. Não há que rotular esta fase como “terrível”. Basta apoiar o adolescente, estar atento a anomalias, dúvidas e angústias. E, porventura, acalmar a ansiedade dos pais.
Como viver com este corpo, que muda hora a hora, segundo a segundo, este corpo que desconheço ou que pareço desconhecer, este corpo que me atrai e repugna ao mesmo tempo, do qual eu gosto tanto e que, às vezes, rejeitaria e substituiria com o maior dos à vontades? Como viver com um ser que desconheço, num ambiente que parece estar a modificar-se hora a hora, que já não é feito à minha medida? Quem sou eu, afinal, neste corpo que alguém me emprestou? Como saio dele? Como me adapto a ele? Quem sou eu, afinal?” crescimento e o desenvolvimento têm destas coisas. Quando se é criança quase não se dá por eles. “Vai-se” crescendo e só quando um tio que nos vê menos ou um amigo que mora longe nos visita e dizem “Que crescido que tu estás” é que pensamos que é verdade, que as calças que tínhamos no inverno passado já nos ficam curtas ou que os sapatos começam a apertar os dedos.
Não há fase da vida, exceto talvez a embrionária e fetal, em que se deem transformações tão profundas e tão rápidas no corpo. Não apenas no tamanho mas na forma, no aspecto, tudo isto somado às também enormes transformações psicológicas, intelectuais, relacionais e sociais. É difícil marcar com exatidão o início da puberdade, dado que a evolução bio-psico-social do ser humano é um continuam, desde a concepção até à morte. Define-se puberdade como “o processo de desenvolvimento que origina os caracteres sexuais secundários e a capacidade de reprodução” e esta fase pode ter uma duração muito variável. Mais: uma alteração num único parâmetro não tem geralmente qualquer significado, sendo necessária a conjugação de vários desvios para se poder suspeitar que alguma coisa não está a correr bem. Em ambos os sexos, mas especialmente nas raparigas, pode dar-se o caso de aparecerem alguns pelos públicos ou haver um discreto aumento dos seios ainda com corpo e mentalidade de criança, ou seja, pelos oito, nove anos. Muitas vezes isto assusta os pais, mais do que os próprios, embora possam surgir problemas quando as outras crianças comentam o assunto entre elas e comparam os respectivos desenvolvimentos, mas tratam-se na generalidade de casos normais e a evolução dos outros caracteres sexuais, orgânicos e psicológicos acaba por não se fazer tão rapidamente, mantendo-se esse estádio durante mais algum.
Um dos exemplos típicos da adolescência é o “estar sempre aos encontrões a tudo” e os jovens são acusados de serem desajeitados, baterem nas coisas, tropeçarem, sendo imediatamente acusados de estar “sempre” a fazer isso ou de ser um “descuidado” e de não ter respeito pelos elementos da família… sobretudo quando derrubam o bibelô oferecido pela tia-avó. No entanto, isto tem a ver com a adaptação à variação da dimensão corporal – sobretudo quando as extremidades começam a crescer mais cedo do que o resto do corpo – e ao instintivo relacionamento entre o corpo e o espaço, que nos regula o à-vontade com que nos movemos e com que fazemos gestos, dentro de sistemas de objetos conhecidos e aos quais estamos habituados, sempre como uma margem de segurança.
“Que farei eu deste meu corpo?” – é a pergunta que lateja na cabeça dos adolescentes, tal e qual uma dor de cabeça insistente. Aos 10 anos sabíamos que não poderíamos saltar de um lado ao outro da sala. Mas agora, com “novos” músculos, pernas e braços, será que já dá? E mesmo que os deuses achem que não, não custa nada tentar, pelo menos uma vez, até que a experiência de bater com o rabo no chão, esbarrar com uma mesa ou partir um candeeiro nos faça afinar e calibrar os critérios. É assim que o corpo e a mente (e as emoções) aprendem a relacionar-se com o espaço – físico e humano – que nos rodeia, e ao mesmo tempo a desafiá-los (a ambos) para ver quais os novos limites.
As raparigas a crescer, os rapazes a ficarem para trás…
A determinada altura, por volta dos 11-13 anos, as raparigas começam a crescer e ficam mais altas e mais desenvolvidas do que os rapazes. Nota-se a diferença. E nota-se tanto mais, quanto mais elas gostam de o afirmar até à exaustão, bem como mostrar que os mais velhos já lhes “dão trela” e que não têm nada a ver com aqueles “putos” que, apenas por mero acaso conjuntural, “habitam” a mesma turma, o mesmo ano e cujo bilhete de identidade apresenta o mesmo ano de nascimento.
Coitados dos rapazes do 7º, do 8º ou do 9º… ficam sem com quem se dar – as raparigas mais novas são umas “chatas” e umas “miudecas”; as mais velhas nem pensar, seria como querer a Lua; e as da mesma idade, até então companheiras de glórias e de angústias, já se dão ares e não querem saber deles para nada. Felizmente esta situação não dura muito, porque em dois ou três anos será a vez deles “darem o salto”, ficando reposta a normalidade.
Entre o ser criança e o ser adulto vai o espaço de uma vertigem, nomeadamente no que respeita à voz. Nos primeiros tempos, o que se ouve são os comentários da família, especialmente em dias de festa: “já está quase um homenzinho!”. A voz começa a ter falsetes, o que, a somar aos comentários sobre o buço ou “qualquer dia as miúdas não te largam”, é de esgotar a paciência a qualquer santo.
Os efeitos da testosterona fazem com que o espaço laríngeo se alargue, o que altera a espessura das cordas vocais. No entanto, como ainda não há uniformidade, nem nas cordas nem na “caixa de voz” laríngea, às vezes saem uns grunhidos, arrotos, falsetes e “crinches” que vêm dar cabo de qualquer ideia que se esteja a transmitir, transformando os adolescentes no centro das atenções, que é como quem diz, no centro do gozo.
Passados uns meses (mesmo que contados por vezes com dois amplos dígitos), tudo estará equilibrado, e os rapazes já se poderão orgulhar da sua “maçã de Adão”, que corresponde, nem mais, nem menos, do que à laringe (embora não tanto, a laringe das raparigas também engrossa, o que faz com que as mulheres adultas tenham a voz mais grossa do que quando eram crianças). A tonalidade e o timbre da voz são características genéticas, dependentes da espessura das cordas vocais e da caixa de ressonância laríngea e dos outros elementos peri-faciais.
http://www.paisefilhos.pt/index.php/criancas/adolescentes/6047-o-que-faco-a-este-corpo
Acesso em 16/07/2014.
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