Num mundo de grandes conquistas tecnológicas, o ser humano, na procura de sua realização, torna-se escravo de sua criação, não conseguindo harmonizar as próprias exigências pessoais, familiares e sociais.
Pesquisas revelam que cerca de 50% dos casais no Brasil se divorciam devido à falta de entendimento em relação ao dinheiro. Dos quatro principais motivos de insônia da população brasileira, três estão, de alguma forma, ligados à vida financeira das pessoas.
O mundo tomou consciência, nos últimos anos, da extrema importância do assunto: “Educação Financeira”.
Assim como ensinamos nossos filhos a atravessar a rua e a dirigir com segurança, deveríamos ensiná-los de onde vem o dinheiro e o que fazemos com ele, diz a psicóloga financeira americana Pamela York Klainer, autora do Best seller: “How much is enough?” “Quanto é suficiente?”
Dr. Içami Tiba, psiquiatra e psicoterapeuta brasileiro, que atende jovens e famílias há 30 anos, nos diz: “As relações das crianças com o dinheiro dependem basicamente, e em primeiro lugar, dos pais, para caminhar bem ou para caminhar mal. E isso porque, os valores e os padrões que os pais adotam para si, em relação às finanças domésticas, ao consumismo, e aos controles e ou descontroles dos gastos que fazem, acabam sendo aqueles que mostram, ensinam e transferem para os filhos.”
O ambiente familiar que deveria fazer evoluir os filhos da completa dependência para a interdependência financeira na vida adulta, muitas vezes não o está conseguindo e os filhos continuam dependentes financeiramente dos pais, eternizando sua adolescência indefinidamente.
Quando se fala de entendimento familiar, nem sempre se encontra uma situação de paz e harmonia em todas as áreas: rusgas, conflitos e discórdias, podem surgir com alguma frequência exigindo paciência e persistência de todos. É especialmente através do diálogo frequente e amigo entre todos os membros da família, que as soluções dos problemas financeiros devem ser encontradas. Muitas vezes, infelizmente, essas excelentes oportunidades de interação familiar são desperdiçadas por cansaço, alegada falta de tempo ou mesmo desinteresse dos pais. Existem pais, por outro lado, que falsamente aparentam tranquilidade e satisfação, por mais problemas e dificuldades que estejam passando, procurando assim poupar seus filhos de sofrimentos e traumas. Inconscientemente, esses pais podem criar dependentes financeiros, totalmente despreparados para a vida adulta, insatisfeitos e sem motivação.
Que atitudes práticas, então, devemos adotar para ensinar nossos filhos, aterem uma relação saudável e “financeiramente inteligente” com o dinheiro?
Sabemos que nossos filhos são influenciados por nós, de forma direta, quando planejamos nossos gastos e prioridades financeiras, bem como indiretamente, através dos valores que nós próprios adotamos sobre o dinheiro.
“Os pais devem se organizar, nos diz Içami Tiba, para poder dar exemplos saudáveis para seus filhos, caso as atitudes positivas não lhes sejam habituais ou espontâneas”.
Os pais devem conversar sobre dinheiro com os filhos, tranquilamente, com serenidade e sem exaltação, levando sempre em consideração a maturidade dos mesmos. Os resultados positivos que a relação com o dinheiro proporciona, favorecem o treinamento financeiro necessário ao desenvolvimento do QIF (quociente de inteligência financeira).
Abaixo, uma série de conceitos que devem ser passados aos nossos filhos, objetivando o amadurecimento financeiro dos mesmos.
– Explicar aos filhos que a origem do dinheiro é sempre o trabalho.
– Conscientizá-los que o dinheiro não é “elástico”.
– Ensiná-los a distinguir o necessário do supérfluo.
– Desestimular o consumo por impulso.
– Orientar para não desperdiçar e economizar.
– Mostrar o valor do dinheiro (coisas “caras e baratas”).
– Incentivar nossas crianças a participar do orçamento doméstico e ouvir sugestões para reduzir despesas.
– Ensiná-los a tomar decisões e fazer escolhas financeiras.
– Ensiná-los a usar dinheiro com responsabilidade ética e social.
– Resistir à tentação de presentear os filhos a todo o momento.
– Não relacionar jamais ganho de dinheiro a desempenho escolar ou tarefas domésticas.
– Procurar o envolvimento dos avôs na educação financeira da criança (limites).
Dar ou não dar mesada aos filhos é decisão de cada família. “Ao dar mesada os pais devem sentir que estão exercendo um direito deles e não simplesmente atendendo a um direito do filho. Ela deve ser considerada pelos nossos filhos um privilégio e não uma obrigação.” (Dr. Haim Grunspun – Psiquiatra Infantil).
“A mesada deve ser usada como instrumento de treino para o uso da liberdade e o exercício da autonomia. Esta é importante e talvez imprescindível para nossos filhos aprenderem a administrar suas fianças. Ainda que não a estejamos conceituando apropriadamente, ela pode ser aproveitada como meio para desenvolver a capacidade de inteligência financeira de nossos filhos, diz Dr. Haim Grunspun. A mesada no adolescente, promove o sentido de interdependência com os pais, que é o ápice da educação”.
Na relação com a “mesada” a criança expressará, de forma concreta, o que os pais conseguiram passar a ela até aquele momento, em matéria de valores e princípios educacionais. Cada um dos “Comportamentos indesejados” estará sinalizando uma nova oportunidade de educação e crescimento para nossos filhos.
Os pequenos desafios gerenciados por nossos filhos desde pequenos, estarão ensinando-os a negociar, perceber o valor da compra e da venda e a necessidade da escolha consciente.
Empréstimos e cobranças, bem como dívidas e quitações em família, favorecem o treinamento para ávida adulta de nossos filhos.
O dinheiro da mesada não deve cobrir despesas essenciais, alertam os especialistas em educação. Por exemplo, o dinheiro do lanche, não gasto, deve ser devolvido. Aprende-se assim o sentido da propriedade. “Este dinheiro não é meu. É de meus pais.”
O ideal é começar dando um dinheirinho, cada dois ou três dias, a partir do momento em que a criança já reconhece o valor do dinheiro, se bem administrado poderá evoluir para “semanada” a qual por sua vez poderá se tornar “mesada” no fim da meninice.
Os pais devem supervisionar inicialmente o dinheiro da mesada: é uma boa oportunidade para ensinar aos filhos, a relação custo-benefício. Supervisionar gastos e impedir que um irmão avance na mesada do outro também é um bom exercício de relacionamento familiar.
Fixe um dia para pagamento da mesada. Não estabeleça como condição para a mesada a execução de trabalhos domésticos. Não use suspensão da mesada como punição.
A origem do dinheiro dos filhos deve ser sempre dos pais; do contrário a criança aprende a gastar sem se importar de quem é o dinheiro.
Em relação ao valor a estabelecer para a mesada, os pais, se possível, devem levar em conta a idade, os desejos e as despesas básicas da criança, considerando também os hábitos de consumo que querem passar para seus filhos.
Ensinar nossos filhos a necessidade de evitar desperdício, tão freqüente em nossas casas, a serem criativos e não gastarem tudo o que recebem, é de nossa responsabilidade como pais.
Reforçar na educação da nova geração que a idéia de responsabilidade ética e social deve estar sempre presente nas formas de ganhar dinheiro.
Os pais devem através da sua participação e doação junto à comunidade, engajando-se em atividades comunitárias.
Como educadores, dificilmente paramos para refletir sobre a importância da educação financeira na formação global de nossos filhos. Esquecemos a enorme responsabilidade que temos, na construção da economia do país e na formação do futuro das novas gerações.
Estamos certos que, o exercício da Educação Financeira no Lar, se constitui numa das melhores ferramentas educacionais e ajuda a introjetar em nossos filhos valores fundamentais como solidariedade, criatividade, disposição para correr riscos, entusiasmo, dinamismo, dedicação pessoal, visão de prosperidade e responsabilidade social e ética.
Este artigo foi publicado nos Anais do 40º Congresso Nacional da Escola de Pais do Brasil, realizado em 2003, com o tema: A convivência familiar e os ambientes externos.
Maria Ainda T. de Mordoh – Economista com especialização em finanças pela Fundação Getúlio Vargas. Organizadora de empresas.
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